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sábado, 10 de janeiro de 2015

OS HERÓIS DA LANCHA VEGA - INVASÃO DE DIU

Memórias de um Nobre Povo - Guerra Colonial
OS HERÓIS DA LANCHA VEGA - INVASÃO DE DIU
Memórias de um Nobre Povo pretende ser um apartado dentro da secção "Guerra Colonial" do meu Blog Revelações, que faça uma homenagem aos nossos militares e ao nosso povo que teve de batalhar pela nossa Nação, dando o seu sangue, sem outra recompensa do que a glória e a honra, nem outro intuíto do que servir a Pátria pelo grande amor e respeito que se tinha dela. Assim, neste apartado, irei publicando pequenos pedaços de históriam um exemplo para todos nós, de que houve e é possível haver, um outro Portugal, com uma outra gente, que luta pela Pátria e pelos valores correctos, em vez de se servir dela para a extorquir, explorar e violar em seu próprio e único interesse. Que nos venha à memória a todos a nobre raça de povo que sempre fomos, mesmo pobres, que mantinha a dignidade humana e não se envergonhava do seu País. Que os nossos jovens entendam que houve quem não teve uma juventude tão fácil, tendo de lutar por valores e conceitos, que hoje tão banalmente atropelamos e deixamos cair.
Aqui fica revelado o primeiro relato destas memórias, que nos transportam a 1961, durante a invasão das forças da União Indiana ao território Nacional de Diu. Uma pequena lancha de fiscalização da Marinha Portuguesa, com a sua heróica tripulação de jovens Portugueses, não exitou perante os factos que se lhes depararam e teve o valor de se enfrentar aos todos poderosos Cruzadores Indianos. Não lhes esperavam chorosas gratificações monetárias ou favores políticos para a família. Enfrentavam a morte por amor à Nação, parava servir como tinham jurado e não para se servirem dela, como infelizmente hoje tanto vemos.

Texto: Português 
Fonte: Liga dos Amigos do Arquivo Histórico Militar - Terra Web









OS HERÓIS DA LANCHA VEGA
 
"Em 18 de Dezembro de 1961, faz hoje 53 anos, durante a invasão de Diu, destacou-se a ação da guarnição da pequena embarcação de fiscalização a lancha Vega.
A embarcação encontrava-se numa missão nas proximidades de Brancavará, no extremo leste da ilha, acompanhada por uma embarcação mais pequena e desarmada, a lancha Folque, quando a bordo se ouviu intenso tiroteio em terra. Na sequência foi dada ordem para ocupar postos de combate e a lancha dirigiu-se para o porto de Diu. O radar da embarcação tinha detectado a presença de um grande eco que navegava oculto, com todas as luzes apagadas e que navegava a aproximadamente 12 milhas da costa.
A lancha voltou ao mar e identificou o navio indiano como sendo um cruzador. O navio indiano fez fogo com munição iluminante para identificar a posição da lancha.
Saindo do campo de tiro do navio, a lancha dirigiu-se novamente para uma posição entre o porto de Diu e o forte do mar.
Às 06:15 a Vega sai novamente para identificar o navio indiano com mais precisão, tendo voltado pelas 06:30.
O comandante, o 2º Tenente Jorge Manuel Catalão Oliveira e Carmo, trajou-se com farda de gala, afirmando que morreria com mais honra e perguntou quem o queria acompanhar na defesa da pátria.
Às 07:00 a força aérea indiana ataca posições portuguesas em terra e a bordo é lida à tripulação uma mensagem em que se determina que combata até gastar todas as munições, devendo a embarcação ser destruída para não cair nas mãos do inimigo.
Às 07:30 O ataque da força aérea indiana dirige-se contra a fortaleza de Diu.
O comandante dá ordem para que se ocupem postos de combate, dirige-se para a barra a toda a velocidade e ordena que a peça antiaérea de 20mm faça fogo contra as aeronaves indianas.
Estas tentam por várias vezes atacar a lancha Vega, que beneficiando da sua pequena dimensão e manobrabilidade consegue escapar várias vezes dos tiros do inimigo. A embarcação foi finalmente atingida numa manobra conjunta de duas aeronaves, tendo atingido mortalmente o marinheiro-artilheiro e ferido com gravidade o próprio comandante.
A peça de proa, uma oerlikon de 20mm, ficara impossibilitada de fazer fogo e a embarcação estava envolta em chamas. As aeronaves indianas voltaram a atacar a lancha por uma segunda vez tendo nessa segunda passagem ferindo os restantes tripulantes e morto o comandante.
A tripulação na água nadou durante três horas contra a maré que os empurrava para o mar alto. Um dos feridos, acabará por morrer antes de atingir terra firme e um dos sobreviventes ficou na água durante 7 horas.
Segundo os relatos da força aérea indiana foram atingidas três aeronaves."



*RELATO DA AÇÃO DA LANCHA VEGA :

CLICK AQUI PARA VER O RELATO DOS ACONTECIMENTOS 




*HOMENAGENS PÓSTUMAS À TRIPULAÇÃO :

Cabo Artilheiro
Aníbal dos Santos Fernandes Jardino
Lancha «Vega»
Índia
Tombou em combate em 18 de Dezembro de 1961
«Pouco se fala hoje em dia nestas coisas mas é bom que para preservação do nosso orgulho como Portugueses, elas não se esqueçam»
Barata da Silva, Vice-Comodoro
Homenagem ao Cabo Artilheiro Aníbal Jardino,
morto em combate na Índia
Imagens extraídas do Blogue Defesa Nacional, no facebook - Joaquim Jorge Santos
Numa organização conjunta da Marinha, Câmara Municipal de Bragança e da Liga dos Combatentes vai ser prestada uma homenagem ao Cabo artilheiro Aníbal Jardino nos próximos dias 02 e 03 de novembro em Bragança, de onde o militar era natural.

No dia 18 de dezembro de 1961 o Cabo artilheiro Aníbal Jardino, embarcado na Lancha “Vega” comandada pelo Segundo-Tenente Oliveira e Carmo, em missão no território da Índia Portuguesa de Diu, faleceu em combate, heroicamente ao serviço de Portugal aquando do ataque aquele território pela União Indiana. Pela coragem evidenciada, entrega e espírito de sacrifício revelados, o Cabo Jardino foi condecorado a título póstumo com a Medalha de Cobre de Valor Militar com Palma.

A forma como toda a guarnição da Lancha Vega combateu, numa luta desigual, contra várias aeronaves indianas, à vista da velha fortaleza de Diu, constitui, ainda hoje, uma das páginas mais brilhantes da História da Marinha Portuguesa.
 

Ordem da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito
 
2.º Tenente
Jorge Manuel C. de Oliveira e Carmo
Comandante da Lancha «Vega»
Índia
Tombou em combate em 18 de Dezembro de 1961
Diz o relatório elaborado pelos sobreviventes que «foi atingido mortalmente no peito» por disparos de um avião; antes, já uma rajada lhe havia cortado «as pernas totalmente pelas coxas». O segundo-tenente, de 25 anos, correu para a morte. Começou por se fardar «de branco», explicando aos marinheiros «que assim morreria com mais honra». Exortou-os a lutar até ao fim: «Fazemos parte da defesa de Diu e da Pátria e vamos cumprir até ao último homem e última bala se possível». Já ferido, despediu-se da mulher e do filho, beijando as fotografias que trazia no bolso.
"Pouco se fala hoje em dia nestas coisas mas é bom que para preservação do nosso orgulho como Portugueses, elas não se esqueçam"
Barata da Silva, Vice-Comodoro
Os Heróis da Lancha de Fiscalização «Vega»


Mortos em combate:

Marinheiro Artilheiro Apontador n.º 10030 António Ferreira
Cabo Artilheiro da RM n.º 10519 - Aníbal dos Santos Fernandes Jardino

Feridos em combate:

Marinheiro Telegrafista n.º 11027 - António da Costa Baguim
Grumete Artilheiro n.º 13032 Venâncio dos Ramos

Sobreviventes do combate:

Marinheiro Fogueiro n.º 5645 - Armando Cardoso da Silva
Marinheiro Electricista n.º 5353 - Francisco Mendes de Freitas
Marinheiro Fogueiro n.º 6788 - António da Silva Nobre

domingo, 14 de dezembro de 2014

GUERRA DO ULTRAMAR: MOÇAMBIQUE - HISTÓRIAS DE CAMPANHA

Guerra Colonial
GUERRA DO ULTRAMAR: MOÇAMBIQUE - HISTÓRIAS DE CAMPANHA
Um dos episódios mais relevantes da nossa história contemporânea, a guerra do ultramar condicionou o nosso País. Ainda está bem presente, pois todos nós conhecemos, ou temos na nossa família até, alguém que tenha combatido numa das 3 frentes dessa guerra.
Aqui tem revelados alguns factos e histórias da campanha militar em Moçambique. Conheça como se organizou e desenvolveu a guerra nesse território, os avances e recuos, as tácticas e os inimigos. A operação militar Nó Górdio levada a cabo pelo General Caluza de Arriaga, fez com que a guerra estivesse practicamente ganha em Moçambique, mas uma decisão do Goberno sem consultar as Forças Armadas no terreno, viria a desiquilibrar a guerra a favor das guerrilhas Moçambicanas. Essa decisão chamou-se Cabora Bassa.

Texto: Português
Áudio: Português
Fontes: YouTube - Wikipédia - Guerra Colonial.org


* DOCUMENTÁRIO: GUERRA COLONIAL: MOÇAMBIQUE - Parte 1







* DOCUMENTÁRIO: GUERRA COLONIAL: MOÇAMBIQUE - Parte 2


CLICK AQUI PARA VER LIGAÇÃO PARA 2ª PARTE DE DOCUMENTÁRIO










A Operação Nó Górdio:


Operação Nó Górdio
Guerra Colonial Portuguesa
Data 1 de Julho a 6 de Agosto de 1970
Local Moçambique
Desfecho Sucesso parcial das forças portuguesas
Combatentes
Portugal Forças Armadas Portuguesas Moçambique FRELIMO
Comandantes
Kaúlza de Arriaga
Forças
+8000 militares
Baixas
132 militares mortos
4 civis mortos
27 feridos graves
55 feridos ligeiros
15 viaturas destruídas e danificadas
651 guerrilheiros mortos
; capturados: 1840
155 minas detectadas
165 campos
61 bases
40 toneladas de armamento capturadas
(a destruição de equipamento e bases é relativa ao primeiros 2 meses da operação)
 
A Operação Nó Górdio foi a maior e mais dispendiosa campanha militar portuguesa na província ultramarina de Moçambique, na África Oriental. Decorreu em 1970, durante a Guerra Colonial Portuguesa (1961 - 1974). Os objectivos desta campanha consistiam em erradicar as rotas de infiltração das guerrilhas independentistas ao longo da fronteira com a Tanzânia e destruir as suas bases permanentes em Moçambique. A Nó Górdio durou sete meses, mobilizou no total trinta e cinco mil militares e foi parcialmente bem-sucedida.
A operação consistia num cerco intenso com vista ao isolamento do núcleo central do Planalto dos Macondes, onde se encontravam as grandes bases de Gungunhana (objectivo A), Moçambique (objectivo B) e Nampula (objectivo C). Após conseguido o isolamento, estava programado o assalto e destruição destes objectivos. Atingindo estes objectivos, esperava-se uma desarticulação e desmoralização da FRELIMO, embora esta não tenha sido impedida de actuar em qualquer dos teatros de operações, conforme se verificou posteriormente.
A Nó Górdio foi lançada sob ordens de Kaúlza de Arriaga, entretanto promovido a comandante-chefe após oito meses de comando de forças terrestres no teatro de operações moçambicano, e executada pelo Comando Operacional das Forças de Intervenção (COFI). O início da Operação Nó Górdio foi marcado para 1 de Julho de 1970, com a presença do general Comandante-Chefe e do seu Estado-Maior em Mueda, prolongando-se até 6 de Agosto, tendo participado mais de oito mil homens, onde se incluía a totalidade das forças especiais (Comandos, pára-quedistas e Fuzileiros) e dos Grupos Especiais e a quase totalidade da artilharia de campanha, unidades de reconhecimento e de engenharia.
Esta operação incluía acção psicológica, com uma secção instalada em Mueda, e equipas de acção psicossocial em Mueda e no Sagal.
Segundo os relatórios em Portugal, terão sido mortos 651 guerrilheiros e 1840 capturados contra 132 militares portugueses mortos. Kaúlza de Arriaga reivindicou também que as suas tropas teriam destruído 61 bases e 165 campos, e capturadas 40 toneladas de munição, apenas nos primeiros dois meses.


Operação Nó Górdio

A situação em Cabo Delgado, em finais de 1969, era de acentuada pressão sobre os aquartelamentos militares portugueses, com a minagem dos itinerários e ataques às colunas tácticas e logísticas, tentando a Frelimo expandir as suas acções para sul do rio Messalo.

Espalhava-se a ideia de que o Planalto Central era zona inacessível às tropas portuguesas depois de, no final desse ano, unidades de pára-quedistas e comandos não terem conseguido alcançar as grandes bases da guerrilha - Gungunhana e Moçambique. Em Dezembro, dois terços das acções da Frelimo estavam concentrados em Cabo Delgado, servindo o triângulo serra do Mapé-Macomia-Chai como apoio dos guerrilheiros, no seu avanço para sul. No primeiro trimestre de 1970, verificou-se a intensificação da guerra, com a Frelimo a ultrapassar o rio Messalo, em direcção ao rio Lúrio, e a confirmação de acções em Tete/Cahora Bassa. A actividade da guerrilha aumentou mais de 40 por cento, continuando a caber a maior percentagem ao emprego de minas. A Frelimo demonstrava um maior interesse pelo sector de Tete, onde se instalavam os grandes empreendimentos económicos de Cahora Bassa. O contínuo agravamento da situação militar e a impossibilidade de aumentar o esforço de guerra, quer em efectivos metropolitanos quer em material de combate, levaram o general Kaúlza de Arriaga, ainda como comandante do Exército, a intensificar a formação de unidades de recrutamento local, que utilizaria intensamente como comandante-chefe. Nos finais de 1969, foi criado o Batalhão de Comandos e formada a 1.ª Companhia de Comandos de Moçambique. Logo em Janeiro de 1970, a Região Militar anunciou a formação dos primeiros seis grupos especiais (GE) de milícias, com o total de quinhentos e cinquenta homens.

Em Abril de 1970, foi referenciada a presença de Samora Machel em Cabo Delgado, para apresentar os planos de uma grande ofensiva a executar em Junho e Julho. Esta visita fez aumentar a actividade militar da Frelimo a nível nunca igualado. De facto, enquanto no segundo trimestre de 1969 o movimento realizou 154 acções, das quais 98 foram minas, no primeiro trimestre de 1970 essas acções subiram para 685 (646 eram minas) e no segundo para 759 (652 eram minas). Com este cenário por pano de fundo, o general Kaúlza de Arriaga, já comandante-chefe, decide lançar a Operação Nó Górdio, atribuindo a sua execução ao Comando Operacional das Forças de Intervenção (COFI), criado em Novembro de 1969 para o emprego conjunto de forças do Exército, Marinha e Força Aérea em missões de grande envergadura, em situações de emergência e em operações especiais. A preparação pode dizer-se que foi iniciada com a primeira experiência do COFI, em Maio de 1970, na condução de uma operação ao longo da estrada Mueda-Mocímboa da Praia, envolvendo unidades de comandos, pára-quedistas e fuzileiros, apoiadas por artilharia e aviação, a qual serviu de treino ao estado-maior do COFI e permitiu aliviar a pressão sobre um itinerário fundamental para o apoio logístico à grande operação que se preparava.

Entretanto, desde a tomada de posse do general Kaúlza de Arriaga que o seu Quartel-General em Nampula trabalhava nos preparativos que iriam concretizar o seu conceito de manobra em acções de contraguerrilha: executar operações de grande envergadura sobre objectivos materializados no terreno, com o máximo de forças.
Para tal, processou-se intensa acção de reparação e reunião de materiais, sobretudo artilharia e auto-metralhadoras; transferiram-se depósitos de munições, combustíveis e víveres para o Norte; prolongou-se a pista de Mueda, de modo a nela poderem operar aviões Fiat G-91, e a de Nangololo, para receber Nord-Atlas de transporte; deslocaram-se efectivos do Sul para o Norte, incluindo algumas unidades em fim de comissão; receberam-se novos materiais, especialmente alguns detectores de minas e rádios; e preparou-se, finalmente, um plano de acção psicológica destinado às populações e forças portuguesas. A maioria destes meios foi reunido em Mueda, que se transformou em enorme base de operações. O início da Operação Nó Górdio foi marcado para 1 de Julho de 1970, com a presença do general Comandante-Chefe e do seu Estado-Maior em Mueda, prolongando-se até 6 de Agosto. Nela participaram mais de oito mil homens, que representavam cerca de 40 por cento dos efectivos das tropas de combate no território (vinte e dois mil), uma concentração que esgotou as reservas disponíveis, pois empenhou a totalidade das unidades de forças especiais (comandos, pára-quedistas e fuzileiros) e os grupos especiais (GE), recém-criados, mais a quase totalidade da artilharia de campanha, unidades de reconhecimento e de engenharia. O conceito da operação assentava num cerco e batida com grandes meios, prevendo o isolamento da área do núcleo central do Planalto dos Macondes, onde se encontravam as grandes bases Gungunhana, Moçambique e Nampula, através de um cerco ao longo dos itinerários Mueda-Sagal-Muidumbe-Nangolo-Miteda-Mueda, com a extensão de 140 quilómetros e, após conseguido o isolamento da área, o assalto e destruição dos principais objectivos do núcleo central:

objectivo A - base de artilharia Gungunhana;
objectivo B - base provincial Moçambique;
objectivo C - base Nampula.

A manobra seria apoiada no terreno com fogos de artilharia e de aviação, em acções de flagelação e de concentração sobre os objectivos. Para criar condições de aproximação a estes e actuar sobre eles, seriam organizados agrupamentos de forças para procederem à abertura simultânea de picadas em direcção aos objectivos A e B, o mesmo sucedendo posteriormente para atingir o objectivo C, e, por fim, previa-se manter o cerco e continuar a bater e a eliminar todas as organizações referenciadas ou a referenciar. As acções militares deveriam ser conjugadas com intensa campanha de acção psicológica, para provocar a rendição e a desmoralização do inimigo. Os agrupamentos de cerco seriam constituídos por unidades de caçadores e por unidades de reconhecimento, realizando as primeiras emboscadas em permanência, enquanto as segundas patrulhariam os itinerários. Os agrupamentos de assalto disporiam de uma composição inter armas, do tipo task force, incluindo unidades de forças especiais, forças regulares, de apoio de fogos (artilharia e morteiros) e de engenharia. A esta cabia papel de grande sacrifício e risco na abertura das picadas tácticas desde as estradas Mueda-Miteda e Miteda-Nangololo até à proximidade dos objectivos, onde seriam criadas as bases de ataque para as forças de assalto. A operação era concebida como manobra do tipo convencional, em que se pretendia alcançar com um ataque em força o que do antecedente não fora conseguido, empregando a surpresa.

 Execução da Operação:

Para cumprimento deste plano foram constituídos sete agrupamentos: dois para o cerco (Norte e Sul) e quatro de intervenção, um para cada objectivo e um para reserva.

- 1 Julho - Início. Os agrupamentos de cerco começaram a sua instalação. Os agrupamentos de assalto A e B principiaram o movimento para os objectivos.
- 3 Julho - O agrupamento de assalto B (pára-quedistas) iniciou a progressão de Nangololo para o objectivo B - base Moçambique - , com o apoio da engenharia na abertura da picada desde Capoca até Gole.
- 4 Julho - O agrupamento de assalto A (comandos) chegou à base de ataque, a dois quilómetros do objectivo - base Gungunhana.
- 5 Julho - Realizou-se a primeira tentativa de assalto à base Gungunhana, que não se encontrava na localização prevista .
- 6 Julho - Foi localizada e assaltada a base Gungunhana, que fora abandonada recentemente. Estava localizada na encosta de uma pequena colina, no interior de mata densa, ocupava a área de 100x500 metros, dispunha de mais de cem palhotas, era circundada por uma vala e tinha abrigos contra morteiros e ataques aéreos.

Foi assaltada a base Moçambique pelas forças pára-quedistas. Era constituída por cerca de duzentas palhotas e encontrava-se abandonada havia cerca de dois meses.

- 12 Julho - O agrupamento de assalto C (fuzileiros) iniciou o deslocamento de Mueda para o objectivo C - base Nampula.
- 15 Julho - Foi atingido o objectivo C. A base Nampula era constituída por cerca de cinquenta palhotas e encontrava-se abandonada há dois meses.
- 16 Julho a 6 Agosto - Realizaram-se acções de permanência.

Após os ataques aos objectivos A, B e C, foram organizadas bases temporárias nas suas proximidades e atribuídas áreas de responsabilidade aos agrupamentos de ataque, com a finalidade de eliminar da zona as unidades de guerrilha ainda activas.
As forças de cerco mantiveram-se em posição até 2 de Agosto, realizando emboscadas e implantando armadilhas, para completar e melhorar a manobra.
Em coordenação com as acções militares foram realizadas operações psicológicas com a finalidade de separar as populações dos guerrilheiros, desmoralizar os combatentes e fomentar as apresentações, considerando-se que a Frelimo controlava cerca de sessenta mil pessoas na zona do planalto.
Para este efeito, foi instalada em Mueda uma secção de acção psicológica, constituídas equipas de recepção de refugiados em Sagal, Diaca, Miteda e Muidumbe e equipas de acção psicossocial em Mueda e no Sagal. Também as autoridades administrativas receberam instruções para armazenar reservas de víveres, a fim de fazerem face às necessidades imediatas de apresentados e capturados.
Contudo, «não obstante a acção psicológica realizada pelas forças nacionais, as populações não se apresentaram. De forma geral, afastaram-se para fora do alcance das forças militares e construíram novas palhotas, ou então regressaram para a proximidade das antigas, logo que lhes foi possível» (extracto do relatório de operação).
Apreciação final da situação pelo comando português:

«Em relação ao inimigo, ele foi:
- Desarticulado, em consequência da destruição das suas organizações;
- Atemorizado, pelo potencial e espírito ofensivo das NT, em que não acreditava;
- Desmoralizado, pelas carências de toda a ordem;
- Desprestigiado perante as populações.

As populações, cansadas de luta tão prolongada, apresentavam acentuado desequilíbrio psicológico. Chegou a "sentir-se" claramente que a população vacilava entre continuar a resistência ou entregar-se.
As forças nacionais, em resultado da consumação, com êxito, de uma operação duríssima e da sua superioridade sobre o inimigo, mostravam-se confiantes em si próprias e nos seus chefes e compreendiam a necessidade de continuar a luta até à vitória final.
Com a destruição do "mito" do núcleo central, toda a iniciativa no distrito de Cabo Delgado passou, sem qualquer dúvida, para as forças nacionais» (extracto do relatório da operação).
A Frelimo, apesar da Operação Nó Górdio, não foi impedida de actuar em qualquer dos teatros de operações. A sua actividade no terceiro trimestre de 1970 provocou as seguintes baixas e destruições às forças portuguesas, nas zonas não abrangidas pela operação:

                             Mortos       Feridos graves       Viaturas destruídas

Niassa                    17                       77                                14
Cabo Delgado       25                       70                                33
Tete                            9                       45                                13

Total                          51                     192                               60

RESULTADOS

Frelimo
Guerrilheiros mortos (em acção directa de combate) 67
Capturados (homens) 31 (mulheres) 42 (crianças) 28

Forças portuguesas
Mortos (militares) 22 *(15)
             (civis) 4
Feridos graves 27 *(27)
Feridos ligeiros 55 *(31)
Viaturas destruídas e danificadas 15
Minas detectadas 155

*( ) Devido a minas

De facto, só em Cabo Delgado, onde se desenrolou a Operação Nó Górdio, as forças da Frelimo realizaram, durante o período em que ela durou (Julho) e depois de anunciada a vitória portuguesa (Agosto e Setembro), as seguintes acções fora da zona de operações:

- 12 de Julho - Ataque a Miteda com um grupo de cerca de cem guerrilheiros, que só se retiraram após as forças portuguesas terem utilizado helicópteros armados e canhão sem recuo;
- 15 Julho - Colocação de 73 minas na estrada Montepuez-Nancatari-Mueda;
- 15 e 16 Julho - Colocação de engenhos explosivos perto de Omar (a norte do núcleo central);
- 21 de Julho - Emboscada na estrada Muaguide-Meluco, a sul do rio Messalo, na região de Macomia;
- 28 e 29 de Julho e 17, 27 e 29 de Agosto - Ataques ao aquartelamento de Omar, sempre com forte potencial de fogo (canhões sem recuo e metralhadoras pesadas) e muito próximo do aquartelamento.

Estas acções da Frelimo, fora da área em que se desenrolou a Operação Nó Górdio, demonstram que o movimento manteve operacionais as suas estruturas em todos os sectores. No Niassa, durante este período, realizou 142 acções, mais 23 do que no trimestre anterior e mais 34 do que em igual período do ano de 1969. Em Tete, efectuou neste trimestre 239 acções, mais 100 do que nos três meses anteriores e mais 141 do que em igual período do ano de 1969.
Em resumo, na zona de Cabo Delgado a Operação Nó Górdio não fez diminuir as acções militares da Frelimo nas áreas exteriores ao núcleo central, onde as forças portuguesas concentraram o seu esforço. Nas frentes do Niassa e de Tete, o movimento aumentou significativamente o número das suas acções.
Em 3 de Agosto, ainda antes do final oficial da Operação Nó Górdio, em ofício enviado pelo Comando-Chefe de Moçambique ao Secretariado-Geral da Defesa Nacional (SGDN), Kaúlza de Arriaga transmitia a opinião de que «vencida e ultrapassada esta fase da guerra em Moçambique, outra poderá ter lugar na qual o inimigo disporá de meios mais evoluídos, como carros de combate, foguetões terra-terra e aviões de combate».
Em Dezembro de 1970, também em ofício para o SGDN, o comandante-chefe de Moçambique afirmava: «Não é possível garantir o sucesso em Moçambique com efectivos actuando em terra inferiores a 105 companhias de caçadores, nove companhias de comandos e quatro companhias de pára-quedistas.»
Em Outubro de 1970, dois meses após o final da operação, o Comando-Chefe de Moçambique considerava como possibilidade mais perigosa que a Frelimo afectasse gravemente o distrito de Tete pelo incremento das acções de guerrilha e pelo seu alastramento à Angónia e a Tete, o que, de facto, veio a verificar-se.
Na sequência da Operação Nó Górdio, as forças portuguesas planearam a Operação Fronteira,canalizando o seu esforço para Norte, enquanto a Frelimo reorientava a sua prioridade para Tete e para o Sul, mantendo contudo pressão suficiente no Norte, para não permitir que as forças portuguesas deslocassem efectivos.
Em contraguerrilha, as operações de grande envergadura ficam, de modo geral, aquém dos resultados esperados, mas a verdade é que surgem sempre comandantes tentados a lançá-Ias.
A Frelimo seguiu as máximas de Sun Tsu, de retirar quando o inimigo ataca e de o atacar quando ele se movimenta. Não admira, por isso, que se verificasse reacção violenta dos guerrilheiros à movimentação das forças portuguesas, em especial na abertura das picadas tácticas, quando estas se encontravam mais vulneráveis; que não defendessem as suas bases, porque o terreno não é importante na guerra de guerrilha; e que o cerco das forças portuguesas não produzisse os resultados desejáveis, pois era muito extenso, os guerrilheiros e as populações conheciam o terreno e a localização das emboscadas, os efectivos disponíveis eram escassos em relação às missões e constituídos ou por unidades recém-chegadas ou que já tinham terminado as suas comissões.
Mesmo o objectivo de conquistar as populações ficou longe de ser alcançado, pois a área era demasiado extensa para as possibilidades de exploração das forças de assalto aos objectivos, o que deu às populações a possibilidade de aguardar o resultado dos acontecimentos em relativa segurança, fora do alcance das forças de cerco. Não admira, por isso, que não se tivesse verificado o êxodo das populações com as consequentes capturas. Acresce que as intensas campanhas de acção psicológica, utilizando meios aéreos de difusão de mensagens, também não motivaram apresentações.













segunda-feira, 10 de novembro de 2014

GUERRA DO ULTRAMAR: OPERAÇÃO MAROSCA - O MASSACRE DE WIRYAMU

Guerra Colonial
GUERRA DO ULTRAMAR: OPERAÇÃO MAROSCA - O MASSACRE DE WIRYAMU
Muitas vezes somos confrontados com filmes da guerra do Vietname e da heroicidade dos soldados Americanos. Esquecemo-nos que Portugal teve a sua guerra e não numa só frente, mas em várias frentes. Uma guerra que talvez tenha sido tão dura, ou ainda mais, do que a do Vietname.Como não temos a poderosa industria cinematografica que tem os USA, pouco sabemos dos episódios dessa guerra sangrenta. Por isso, esta é uma oportunidade única de tomarmos contacto com um dos episódios negros da nossa guerra do ultramar e do inferno que ela constituiu para as povoações e para os nossos soldados. Conhecida como "Operação Marosca", nunca foi oficialmente reconhecida, no entanto é inegável que algo se passou naquele dia fatídico.
O episódio deu-se em Moçambique na região do Tete, a 16 de Dezembro de 1972, vindo a ser denunciado pelo padre católico Irlandês Adrian Hastings a uns missionários Espanhois. Os relatos afirmam que as tropas Portuguesas (victimas de inúmeras emboscadas por denuncias dos habitantes dessas aldeias que lhes causavam a morte, há que dizê-lo) bombardearam com aviões e desembarcaram de 5 helicópteros nessas aldeias, tendo cercado as aldeias e matado cerca de 400 pessoas.
Estes relatórios foram usados contra o governo Português, por Nações estrangeiras com interesses em África e por partidos políticos Portugueses, então proíbidos e na clandestinidade, como forma de pressão para acabarem com a guerra e darem a independência aos territórios então em guerra, pelo que se pensava terem sido exagerados. No entanto, é sabido que em todas as guerras há excessos.
25 anos passados, o então comandante da companhia de Comandos que executou as ordens, arrisca a vida e volta ao local onde tudo aconteceu, para saber o que realmente aconteceu e se o que os relatórios contam são verdade.
Aqui tem revelada toda a informação acerca deste terrível episódio, com relatório das victimas, relatos de sobreviventes, descrições e imagens dos acontecimentos com pormenores que podem afectar a sua sensibilidade.
Trata-se sem dúvida de um documento que mostra a crueldade de todas as guerras em geral, e em particular da pressão a que estiveram expostos os nossos soldados.
Lembro que de forma alguma podemos, a esta distancia e fora desse ambiente, julgar o comportamento de quem quer que seja (nem é isso que se pretende com esta publicação) até porque em primeiro lugar, esses soldados cumpriram ordens. Apenas pretendo lembrar uma época pela qual muitos dos nossos familiares passaram e alguns estiveram expostos. Portugal não tem de receber lições de nenhum País, acerca de ser Patriotas, lutar pela Pátria, grandes soldados, heróis de guerra, guerras brutais ou sobre ações de solidariedade e defesa das populações que ficam muito bem nas telas dos cinemas de alguns Países. Também nós tivemos as nossas guerras e os nossos heróis. Feliz ou infelizmente.

Áudio: Português
Texto: Português
Fontes: YouTube - Terraweb - Página Global

* DOCUMENTÁRIO: MASSACRE DE WIRYAMU - MOÇAMBIQUE:







* LISTA DE VICTIMAS E RELATÓRIOS SOBRE O MASSACRE:

OS MASSACRES DE TETE
16 de Dezembro de1972













O texto que se segue sobre os massacres de Chawola, Wiriyamu e Juwau, confirmam as afirmações feitas pelo padre Hastings, com base no testemunho dos 3 padres de Burgos expulsos depois dos massacres e é ainda confirmado por varias pessoas (soldados e civis) que estiveram em Tete nesta altura. 














I. O MASSACRE DE CHAWOLA ( Sab. 16/12/72 )
Mais ou menos pelas pelas 14 horas, 2 reactores bombardearam as povoações de Wiriyamu e Juwau a uns 25 Km de Tete (cidade), no regulado de Gandali; enquanto 5 helicópteros desembarcavam tropas armadas , que cercavam as ditas povoações e metralhavam o povo , que fugia do bombardeamento.
Eram duas grandes povoações, mas não sabemos o número dos sobreviventes. O certo é que tais povoações foram totalmente aniquiladas e arrasadas. A população de Chawola, povoação esta muito próxima das de Wiriyamu e Juwau. vendo o fogo dos bombardeamentos, das metreIhadoras e das palhotas a arder, juntou-se aterrorizada no pátio de Chawola. Pouco depois viu-se cercada pelas tropas, que entravam a disparar. O povo tentou fugir, mas os soldados reuniram de novo e imediatamente saquearam as palhotas (roubando dinheiro, roupa, rádios, etc.).
A seguir as tropas obrigam o povo a bater as palmas, para se despedir da vida, visto que já ia morrer, ordem a que o povo obedeceu. Enquanto batia as palmas, os soldados abriram fogo sobre a população reunida, fuzilando homens, mulheres e crianças. Juntaram os corpos, cobriram-nos de capim e deitaram-lhes fogo.
Enquanto os soldados incendiavam as palhotas, alguns, que tinham sido apenas feridos, e conseguiram sair da pilha já a arder. Destes, uns morreram no mato e outros encontram-se hospitalizados.
No dia seguinte ao destes massacres, somente no pátio de Chawola, contaram-se 53 cadáveres, dos quais foram identificadas os seguintes:



1. Chawola
2. Mwataika (mulher de Chawola)
3. Xavier (jovem, irmão de Chawola)
4. Mixoni
5. Firina (mulher de Mixoni)
6. Luciano (filho de Mixoni,adulto)
7. Rita (filha de Mixoni,7a.)
8. Irisoni
9. Soza (mulher de Irisoni}
10. Liria. (mulher de Irisoni)
11. Posi (filha de Irisoni, 1 mês)
12. Chinai (filho de Irisoni,8a)
13. Tsapwe (filho de Irisoni, 9a)
14. Lusia (filha de Irisoni, 9a.)
15. Chipiri (filho de Irisoni, 8a)
16. Ramadi (filho de Irisoni)
17. Luisa (muler de Ramadi)
18. Manuel (filho de Ramadi,1 ano)
19. Akimo
20. Joana (mulher de Akimo)
21. Birifi
22. M'balamyama (mulher de Birifi)
23. Kapeno (filho de Birifi, 7anos)
24. Mataka (filho de Birifi, 9a)
25. Batista .
26. Asseria (mulher de Batista}
27. Makau (filha de batista, 8a)
28. Sabudu (filho de Batista,3 anos)
29. Medeka
30. Firipa (mulher de Medeka)
31. Adamu (filho de Medeka 10 anos)
32. Mechenga
33. Chifanikiso (filho de Mechenga)
34. Kunesa
35. Julio (filho de Kunesa, 15)
36. Mako
37. Pinto (11anos)
38. Mayesa (9 anos)
18. Manuel (filho de Ramadi, 1ano)
39. Kundani
19. Akimo
40. Djipi (9anos)
20. Joana (mulher de Akimo)
41. Nsembera
21. Birifi
42. Pita






1º - Todos estes factos foram-nos narrados pelos tais sobreviventes, que conseguiram sair da pilha e se encontram hospitaliados em Tete e tambem por outros que lograram escapar a tempo.

-A identificação dos cadaveres fo levada a efeito por pessoas que, de proposito se deslocaram as povoações massacradas

- Os que conseguiram sair da pilha foram:

1. Antonio (filho de Mixoni, 15 anos)
2. Domingos (filho de Mixoni, 4 anos)
3. Serina (filha de Irisoni, 13 anos)
4. Tembo (filho de Batista, 5 anos)
5. Manuel (filho de Mwantulujali, 15 anos)
6. Podista (mulher de Mchenga)

Se fizermos um inquerito apoiado pelas autoridades, poderiamos saber se o numero de mortos de todas as aldeias massacradas naquela area ultrapassa os quinhentos como o povo assegura.
Se não houve massacre, se so foi destruida uma base de terroristas, se crianças de 1 a 10 anos não são "terroristas" ; se velhos e velhas e mulheres com crianças ao colo não são "terroristas", não teremos então receio de abrir um inquerito público, para verificar a veracidade destes massacres.
Se apenas foi destruido um acampamento de "turras", e se um acampamento de "turras" não é o mesmo que uma povoação tradicional onde vivem homens, mulheres e filhos, onde tem a sua mapira, 0 seu milho, 0 seu vestuario, etc. que vamos então ao local destas povoações, que existiam com os seus habitantes e haveres, e encontraremos a realidade!- que não foi um acampamento de "terroristas" que foi destruido, mas um grupo de povoações com as suas populações indefesas.



Tete, 19 de Dezembro de 1972

P.S. -Na altura em que acabavamos de redigir este relatorio, chegou-nos a noticia de que os massacres ainda continuavam em várias outras povoações como na de Luis, Corneta e outras, avançando para Gama, no régulado do Rego.



II - O MASSACRE DE WIRIYAMU E JUWAU (sábado 16-12-72 )


Estivemos em busca de elementos de juizo.

Apesar das dificuldades que surgiram (impostas umas, circunstanciais outras), de elaborarmos uma lista completa dos nomes das vitimas do massacre das povoaçoes de Wiriyamu e Juwau , as fontes dos pormenores que conseguimos dão-nos 0 direito de seguirmos mantendo a afirmação de ali ter havido mais quatro centenas de vitimas (cerca de 500).
Da nossa diligencia pudemos apurar 0 seguinte:
Na tarde do dia 16 de Dezembro do ano findo, como já ficou dito na primeira parte deste nosso relatório, as povoações de Wiriyamu e Juwau foram vitimas de uma incursao militar, da parte das forças da orderm.
Depois do bombardeamento, os soldados-comandos, previamente heli-transportados que jaá haviam posto cerco às ditas povoações invadiram-nas com fúria, aumentando a terror dos seus habitantes já em panico pelos bombardeios.
Uma vez dentro das povoações, esse grupo entregou-se imedatamente ao saque das palhotas, seguindo-se depois o massacre do povo, que se revestiu de excesso de crueldade.
Um grupo de soldados juntou uma parte do povo num pátio, para 0 fuzilamento. O povo assim reunido foi obrigado a agrupar-se sentado em dois grupos: 0 grupo dos homens, num lado, e o das mulheres, noutro, a fim de poderem todos ver melhor como iam caindo os fuzilados.
Um soldado chamava por sinal a quem quisesse (quer homem, quer mulher, quer criança),
0 designado punha-se de pé, destacava-se do conjunto, 0 soldado disparava sobre ele e a vitima caia fulminada. Este foi 0 processo que fez mais vitimas. Muitas crianças morreram ao colo das suas maes, fuzilada juntamente com elas. Entre muitos outros. os soldados assim mataram:



1 Dzedzereke (homem adulto)
2 Mafita (mulher de Dzedzereka)
3 Kufuniwa (filho de " )
4. Birista (mulher adulta)
5. Luwo (rapaz ,2 anos)
6. Lekerani (homem adulto)
7. Sinoria (mulher de Lekerani)
8. Chamdindi (filho de Lekerani, 5 an.)
9. Nguiniya (mulher adulta)
lO.Firipi (homem adulto)
11.Bziyese (mulher de Firipi)
l2.Feta (filha de Firipi)
l3.Meza (filho de Firipi)
l4.Thangweradzulo (filho de Firipi)
l5.Zerista (mulher adulta)
l6.Bwezani (homem adulto)
l7.Aqueria (mulher adulta)
l8.Khapitoni (homem adulto)
19. Bunitu (mu lher de Khap.)
20.Mamaria (mulher de Khap.)
2l.Tinta (filho de Khap.)
22.Chawene (filh. de Khap, 2an.)
23.Chinai (filho de Khap.,4an.)
24.Kuoniwa (fil. Khap.,12an.)
25. Liyanola (mu lhet' adu1 ta)
26.Djemuse (hamem adulto)
27.Julina (mulher adulta)
28.Djipi (rapaz, 9anos)
29.Alista (mulher adulta)
30.Mtsimpho (homem adulto)
3l. Nsemberembe (rapaz, 9an.)
32.Vira (mulher adulta)
33.Thomasi (homem adulto)
34.Artencia (rapariga,13an.)
35.Duwalinya (mulher adulta)
36. Sad1sta (mulher adulta)
37.Florinda (mulher adulta)
38.Siria (mulher adulta)
39.Saizi (homem adulto)
40.Maviranti (mulher de Saizi)
4l.Domingos(filh Saizi,5 anos\
42.Maloza (mulher de Saizi)
43.Sederia (fil. de Saizi)
44 .Mboi (fil.de Saizi)
45.Gwaninfuwa (homem adulto)
46.Kachingamba (rapaz, 4 anos)
47.Kuxupika (homem adulto)
48.Manyanyi (mulher de Kuxupika)
49 .Mapalata (mulher de Kuxupika)
50.Cirio (filh. Kuxupika,5 anos)
5l.Kutongiwa (homem adulto)
52.Maria (filha de Kutongiwa)
53.Olinda (rapariga, 10 anos)
54.Lainya (mulher adulta)
55.Luwina (mulher adulta)
56.Aluviyana (mulher adulta)
57.Kuitenti (homem adulto)
58.Caetano (rapaz, 5anos)
59.Kuchepa (rapaz,12anos)
60.Bziuzeyani (mulher adulta)
61.Djinja (homem adulto)
62.Alufinati (homem adulto)
63.Zabere (rapariga l4 anos)
64.Aesta (rapariga,16 anos)
65.Rosa (rapariga,5 anos)
66.Zaveria (rapariga,16anos)
67.Alista (rapariga,14 anos)
68.Mbiriyadende (homem adul.)
69.Guideria (mulher adulta)
70.Khembo (homem adulto)
71.Kamusi (rapaz, 2 anos)
T2.Chinteya (rpariga,4 anos)
73.Sunturau (irmao de Kuxupika)
74.Dzivani (rapaz,12 anos)
75.Zeca (rapaz,12 anos)
76.Mgreta (mulher adulta)
77.Dinho (filho de Magreta,2 anos)
78.Hortencia (irma de Magreta)
79.Mario (irmao de Magreta ,10 anos)
80.Chuva (homem adulto)
81.Kirina (mulher de Chuva)
82.Fuguete (homem adulto)
83.Rita (rapariga, 4anos)
84.Eduardo (rapaz, 7anos)
85.Tembo (rapaz, 3anos)

... Outros soldados,que andavam dispersos, obrigavam a gente a meter-se para dentro das palhotas, que depois incendiavam, morrendo a gente queimada dentro delas.
As vezes, antes de pegar fogo as palhotas, lançavam para dentro delas granadas, que explodiam sobre as vitimas. Depois é que deitavam fogo as palhotas. Dessa maneira, entre outros,
foram mortos:



I.Chakupendeka (homem velho)
2.Bwanbuluka (mulher de Chak.)
3.Kulinga (filho de Chak.)
4.Naderia (mulher de Kulinga)
5.Luwa (filha de Ruling, 2an.)
6.Marianela (filh. Kulinga,4 an.)
7.Tembo (filho de Kulinga, 8meses)
8.Keresiya (mulher adulta)
9.Joaozinho (fil. Kere.,2 an.)
10.Malota(fil. Ker. , 2 meses)
11.Kamchembere (rapariga,1 mes)
l2. Masalambani (rapaz, 6 anos)
13.Chinai (rapaz, 5 anos)
14.Domingos (rapaz, 5 anos)
15 .Mboi (rapariga, 10 meses)
l6.Chiposi (rapariga, 3 anos)
l7.Augusto (rapaz,1 ano)
8 .Farau (rapaz, 2 meses)
19.Antonio (rapaz,6 anos)
20.Anguina (mulher adulta)
21.Jantar (homem adulto)
22.Luisa (rapariga,4 anos)
23.Matias (rapaz,2 anos)
24.Nkhende (rapaz,1 ano)
25.Xanu (rapaz,7 anos)
26.Djoni (homem adulto)
27.Chaweno (rapaz,4 anos)
28. Lodiya (mulher adulta)
29.Mario (rapaz,5 anos)
30.Fostina (mulher adu1ta)
3l. Rosa (rapariga,4 anos)
32. Maria (rapariga, 2 anos)
33. Boy (rapaz,3 anos)

…Outros soldados divertiam-se a matar crianças, agarrando-as pelas pernas, arremessando-as contra o solo ou contra as árrvores. Entre várias crianças, assim morreram:

1. Domingas (rapariga,1 mês)
6. Makonde (rapaz,2 anos)
2. Xanu (rapaz,2 anos)
7. Mako (rapaz,1 ano)
3. Kulewa (rapaz,3anos)
8. Luisa (rapariga, 4 anos)
4. Chipiri (rapaz, 2 anos)
9. Mario (rapaz,4 anos)
5. Chuma(rapariga,4 anos)
10 Raul (rapaz,4 anos)




“"PHANI WENSE !” - ''MATAI-OS A TODOS"

Uma voz autoritaria fazia-se ouvir cam frequencia: "Pham. ,wense!" "Matai-os a todos". "Que não fique nenhum!". Era a voz do agente da D.G.S., Chico Kachavi.
Diz uma testemunha que um oficial militar tinha sugerido a via da clemencia, no sentido de conduzir aquela pobre gente para um aldeamento. Mas a voz sinistra do agente Chico fez-se ouvir ainda com mais furia: "Sao ordens do nosso chefe" -dizia –“ Matar a todos. Os que se poupam são os que nos têm denunciado".
Duas crian~as daquelas povoa~oes, encontradas casua1mente depois da consumação do massacre, foram friamente queimadas dentro de uma choça pelo mesmo agente da D.G.S. sob 0 pretexto de uma possível denuncia.
Naquela tarde. em Wiriyamu e Juwau só se ouviam os berros dos soldados, os disparos das armas e os gemidos das vitimas feridas de morte. –O povo de Wiriyamu e Juwau viveu momentos de terrível angustia!
Estas cenas duraram ate ao por-do-sol. Nessa altura a soladesca estava ja fatigada de tanta sevícia. Algumas vitimas lograram escapar da morte, fugindo. Elas deram-nos também, como testemunhas oculares muitos dos promenores aqui expostos que, por ' isso, asseguramos ser autênticos.
Demais a Comissao da Delegação de Saúde de Tete, que se deslocou ao local de massacre cerea de vinte dias depois (muito tarde, por conseguinte!), para averiguação, não desmente nosso re1atorio.
Tete, 6 de Janeiro de 1973
(excertos retirados de de um relatório policopiado que circulava clandestinamento em Moçambique em 1973)
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Mystery Massacre
Time, Monday, Jul. 30, 1973

Not since the My Lai atrocities came to light in 1969 had a tiny village caused such an uproar. Father Adrian Hastings, a British Catholic priest, alleged that Portuguese government troops had gone on a murderous rampage in the Portuguese Mozambique village of Wiriyamu last Dec. 16. The priest, quoting reports from Spanish missionary priests, claimed that Portuguese soldiers killed some 400 villagers suspected of sympathizing with Frelimo, the Mozambique Liberation Front.
Then began the denials. Dr. Marcello Caetano, the Portuguese Prime Minister, who was on an official visit to London, said that his government's preliminary inquiry showed a massacre of 400 villagers "could not have taken place." A Catholic bishop in Mozambique who in published reports claimed that he had seen the dead bodies later stubbornly declined either to confirm or deny that there had been a massacre. In Lisbon, officials insisted that Wiriyamu did not even exist. Indeed, Father Hastings two weeks ago placed it in western central Mozambique, but next day corrected himself, saying it was in the eastern Tete province. Reporters have been searching for it ever since, and for anyone who claims to have seen the massacre. TIME Correspondent Peter Hawthorne joined a trek last week and afterward sent this report:
The town of Tete bristles with troops, military roadblocks and armored vehicles. People are being moved out of isolated villages and relocated in protected settlements called aldeamentos, where troops and home-guard units keep Frelimo infiltrators at bay.
A 30-man army escort took us to a place called Wiliamo, about eight miles from Tete. The guide was a black army private who said he knew of the village.
He pronounced it "Wiriamu"—many Africans pronounce "l" as "r"—but wrote it "Wiliamo." It was the only place of that name that he knew in the region, he said. Of course there are villages with vaguely similar names all over the areas variously mentioned by Father Hastings, and presumably any of them could be the massacre site.
The village, perhaps ten to fifteen huts, had clearly been abandoned in a hurry. But there was no obvious sign of a firefight—no bullet marks in the tree stumps or huts. It would require nothing less than a team of forensic experts to track down any evidence of a massacre.
No Angels. "My men aren't angels or they wouldn't be good soldiers," said Major José Carvalho, who led the army escort. "But a massacre of 400? During my two years service here I've never heard of such an incident, and if I did it would be the reason for a large-scale military inquiry."
Two priests of the Spanish Burgos Fathers who earlier supported allegations of the massacre have been detained by Portuguese authorities in Lourengo Marques on unspecified charges "relating to the security of the state." Their fellow priests at the Mission of São Pedro, near Tete, will say nothing. Some Portuguese here believe it is quite possible that a massacre did occur. The secretary of the Bishop of Tete, Father Manuel Mouro, told me:
"In a climate of war anything is possible —but between the possible and the real, there may be a big difference."
  

"Portugal planeou um genocídio?", publicado no jornal Público, de 10 de Setembro de 1995
  * TESTEMUNHO E DATAS COM ANTECEDENTES AO MASSACRE:
Um massacre ainda "desconhecido"
Wiriyamu, Moçambique, 12 dez (Lusa) - Passaram 40 anos sobre o massacre de Wiriyamu, cometido por tropas especiais portuguesas sobre civis suspeitos de apoiarem a Frelimo, no centro de Moçambique, mas os contornos da "Operação Marosca" continuam ainda envoltos num certo mistério.
"Continua difícil verificar com precisão os acontecimentos de 16 de dezembro de 1972 (...) Isto porque as autoridades portuguesas, quer antes, quer depois do golpe de 25 de abril de 1974, não autorizaram um inquérito independente à Operação Marosca", queixam-se os investigadores portugueses Bruno C. Reis e Pedro A. Oliveira num texto publicado em março deste ano na revista 'Civil Wars' ("Cutting Heads or Winning Hearts: Late Colonial Portuguese Counterinsurgency and the Wiriyamu Massacre of 1972").
Apenas um pequeno sinal, quase escondido na berma da estrada nacional 7, à saída de Tete, indica o desvio para Wiriyamu, o local de um dos maiores massacres ocorridos na então província portuguesa e que terá apressado o fim das guerras coloniais que Portugal travava em África.
Na aldeia, um monumento com ossadas humanas evoca a tragédia ocorrida em Wiriyamu, Juwau e Chawola, três povoados nas cercanias dos rios Zambeze e Luena, mas o jovem Carrilho, 12 anos, que ali passa de bicicleta, não consegue identificar nem os seus responsáveis nem o que aconteceu.
O diretor da escola primária completa de Wiriyamu, Carlos Alciano, 40 anos, garante que o massacre faz parte do programa de ensino dos alunos da sexta e sétima classes e que as visitas ao monumento são frequentes.
"Eles têm que conhecer quando surgiu o massacre, quem o fez, quantas pessoas morreram", diz, mas o número de vítimas varia: "400", segundo os padres de Burgos, os primeiros a denunciaram o massacre, "cerca de 200", de acordo com o médico Rodrigues dos Santos, que visitou o local pouco depois dos acontecimentos, "63" ou "98", assumidas por autoridades portuguesas, segundo diversas fontes, ou os "450" evocados na base do monumento em Wiriyamu.
Independentemente do número de mortes, a "Operação Marosca" resultou num massacre, "a ocorrência de crimes e, por vezes, extremamente cruéis, execuções de civis desarmados, em grande número", asseguram os dois investigadores portugueses.
Bruno Reis e Pedro Oliveira defendem, no entanto, que, se se pode dizer que se tratou de "matança indiscriminada", já que ninguém foi poupado, também se pode afirmar o seu contrário, no sentido de que "a operação tinha como alvo o que era visto como bases da Frelimo disfarçadas de aldeias civis" e que os militares portugueses se baseavam em informações aparentemente falsas da PIDE/DGS.
"Isto, de nenhuma forma, reduz a criminalidade destas mortes mas, simplesmente, alarga a responsabilidade para lá dos soldados individuais e seus comandantes", escrevem.
À operação estão associados o então comandante militar de Moçambique, Kaúlza de Arriaga, e o seu conceito de luta anti-guerrilha, envolvendo fortes meios aéreos e tropas especiais, e o agente da PIDE/DGS Chico Kachavi, um moçambicano temido pelos seus conterrâneos.
"Ele é que comandava nesse dia, e não queria saber se este era africano. O coração dele era europeu", recorda Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, sobrevivente do massacre, e que diz que o agente da PIDE/DGS foi mais tarde morto por elementos da Frelimo.
LAS // HB
Principais datas relacionadas com massacre
12 de Dezembro de 2012, 08:44
Maputo, 12 dez (Lusa) -- Há 40 anos, tropas especiais portuguesas entraram em três aldeias no centro de Moçambique e mataram centenas de pessoas no que foi conhecido como o massacre de Wiriyamu.
A violência indignou o mundo, isolou Portugal e contribuiu para o agravar das divergências nas Forças Armadas portuguesas, que conduziriam ao 25 de Abril de 1974, e também para o reforço da Frelimo que, menos de dois anos depois, proclamou a independência de Moçambique.
Cronologia das principais datas:
1962
25 set - Frelimo inicia luta armada contra colonialismo português, no norte de Moçambique.
1968
08 mar -- Frelimo abre frente de Tete, no centro.
1970
01 jul/06 ago -- "Operação Nó Górdio", dirigida por Kaúlza de Arriaga, no norte de Moçambique, contra a Frelimo
1972
18 nov -- Grande ofensiva da Frelimo em Cabo Delgado, Niassa e Tete
14 dez -- Um avião civil que sobrevoa Wiriyamu é alvejado. No mesmo dia, a PIDE/DGS envia uma equipa ao terreno para obter informações sobre o caso.
15 dez - Seis militares portugueses são mortos numa emboscada, enquanto batiam a zona.
16 dez - Assassínio de cerca de 400 pessoas nas povoações de Chawola, Juwau e Wiriyamu, a cerca de 25 quilómetros da cidade de Tete
1973
06 jan -- Representante da Cruz Vermelha e médico do hospital de Tete visitam o local do massacre.
Jun - Denúncia dos missionários espanhóis, a quem tinham sido passadas as primeiras informações, enviada à Amnistia Internacional em Londres
07 jul -- Notícia do massacre na capa do 'The Times', de Londres
15 jul - Manifestação em Londres contra a política africana do Governo português, pedindo a anulação da visita do presidente do Conselho português, Marcelo Caetano.
16 jul -- Marcelo Caetano inicia visita a Londres, por ocasião dos 600 anos da aliança anglo-portuguesa, no meio de fortes protestos.
01 ago - Kaúlza de Arriaga abandona o cargo de Comandante-Chefe das Forças Armadas de Moçambique.
21 ago -- Comunicado do Ministério da Defesa de Portugal que admite que "alguns elementos das Forças Armadas, em destacamento, ignorando ordens, cometeram atos repreensíveis na região de Tete".
1974
07 set -- Portugal e Frelimo concordam na independência de Moçambique, marcada para 25 de junho de 1975.
22 nov -- Relatório da comissão de inquérito da ONU aos noticiados massacres em Moçambique: "A comissão dá-se por completamente satisfeita com as provas de que, a 16 de dezembro de 1972, tropas portuguesas dirigidas por agentes da DGS cercaram as aldeias de Chawola, João e Wiriyamu, entraram nas aldeias, mataram qualquer pessoa à vista e, na operação, destruíram as aldeias (...). Estima-se que o número de vítimas seja superior a 400 nas três aldeias".
LAS // HB
O massacre de Wiriyamu segundo o sobrevivente Vinte Pacanet Gandar - reportagem
12 de Dezembro de 2012, 08:44
Luís Andrade de Sá, da Agência Lusa
Wiriyamu, Moçambique, 12 dez (Lusa) - Não é por terem passado 40 anos que parece que as coisas mudaram em Wiriyamu: não há eletricidade nem água e a cidade de Tete, a 30 quilómetros, ligada por uma picada de terra batida, continua insuportavelmente distante.
"E fome existe, também", acrescenta Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, camponês de Wiriyamu. E, para que não restem dúvidas, repete: "E fome".
A quase permanente seca na região, no centro de Moçambique, afeta a produção de mapira e amendoim, que todos cultivam para consumo próprio, e o pouco dinheiro, as raras moedas que usam para comprarem óleo ou sementes, obtêm-se com a venda de carvão na cidade.
Luís Wiriyamu, 27 anos, neto do homem que deu o nome à aldeia, vive de apanhar lenha que, depois, transforma em carvão e vende na berma na estrada -- "Não há mais nada para fazer aqui", queixa-se.
A escola primária, um painel solar numa pequena venda e os camiões de uma mineira australiana, a caminho de mais um projeto nas imediações, destacam-se na paisagem de casas de paredes de barro e telhados de colmo, em veredas de terra batida, por entre embondeiros e mato cerrado, por onde meninas carregam à cabeça feixes de lenha que vão alimentar o fogo com que mulheres cozinham o almoço.
Vinte Pacanet Gandar, que se expressa num português desenvolto, foi um dos sobreviventes do massacre de Wiriyamu perpetrado naquela aldeia por tropas portuguesas, no dia 16 de dezembro de 1972, que vitimou centenas de pessoas e, segundo historiadores, mudou o rumo da guerra colonial.
A sua condição de sobrevivente granjeou-lhe fama, mas também a construção de uma narrativa, quase de um fôlego, do massacre cometido por tropas especiais portuguesas.
"Surpresamente, apareceram cinco helicópteros e dois jatos que começaram a bombardear lá fora, e, então, aterraram na aldeia para os soldados saírem", conta Vinte, que tinha, então, 23 anos.
A "Operação Marosca" tivera como motivos próximos a morte, dois dias antes, de seis militares em Tete, e disparos, na zona, contra um avião civil, sinais para as chefias militares de que a Frelimo atuava no centro da colónia, com o apoio da população.
"Cercaram a nossa aldeia. Começaram a queimar o quê? As casas. Levaram as pessoas para acumular lá fora. E começaram a perguntar: 'Vocês aí, não conhecem os turras? E nós falávamos: 'Não, não conhecemos'", prossegue o camponês.
As sucessivas lideranças militares portuguesas em Moçambique tinham encarado de forma diferente o "problema" da Frelimo e a guerra de libertação iniciada em 1962, e, no início, apenas circunscrita ao norte do país.
Comandante militar desde 1969, Kaúlza de Arriaga inova relativamente aos seus antecessores, ao usar intensivamente meios aéreos e tropas especiais, o que fragiliza a Frelimo no norte, obrigando-a a deslocar-se para o centro, onde intensifica essa frente de guerra e se ataca, até, colonos portugueses.
"Mas eles disseram: 'Não, não, aqui há turras e vocês estão a tirar comida para dar aos turras para os turras vir matar a nós, lá na estrada. Por isso, vocês, hoje, não vão viver nada, vão ser mortos aqui'", continua Vinte, dando a voz aos militares portugueses.
A zona de Wiriyamu estava a ser batida desde o dia 14 por aviões militares e agentes da PIDE/DGS, que procuravam uma base da Frelimo com cerca de 300 guerrilheiros.
Depois, tropas especiais entram em Wiriyamu, Juwau e Chawola, todas aldeias na mesma zona, e, a 16 de dezembro, recolhem aos quartéis, deixando um rasto de destruição, hoje evocada num monumento que guarda caveiras e ossadas de alguns dos "mais de 450 mortos".
Vinte safou-se, correndo para o mato e evitando os tiros que disparavam contra ele, mas a sua família foi quase toda dizimada: "Quem morreu? O meu pai, chamado Guspiga, meu avô, Jemusse, Mabalata, Manyate ... são muitos ... Tuma, Capitone... são muitos".
Alguns feridos abrigam-se no hospital de Tete e denunciam o massacre a missionários espanhóis. No início de 1973, a Cruz Vermelha e um médico português visitam o local, em junho do mesmo ano, o escândalo chega à imprensa internacional, e Portugal, que, até aí, tinha negado os acontecimentos, acabará por admitir "excessos" das suas tropas.
Dois anos depois de a notícia ser capa do 'Times', de Londres, Moçambique torna-se independente e, 40 após o massacre, só por distração alguém pode achar que continua tudo igual em Wiriyamu.
"Antigamente, não tínhamos escola. As pessoas que têm idade como a minha não falam português, aqui, mas, hoje, as nossas crianças estão a estudar e, quando acabarem, vão fazer bom trabalho", prevê Vinte Pacanet Gandar, o camponês de Wiriyamu que sobreviveu ao massacre.