Memórias de um Nobre Povo - Guerra Colonial
OS HERÓIS DA LANCHA VEGA - INVASÃO DE DIU
Memórias de um Nobre Povo pretende ser um apartado dentro da secção "Guerra Colonial" do meu Blog Revelações, que faça uma homenagem aos nossos militares e ao nosso povo que teve de batalhar pela nossa Nação, dando o seu sangue, sem outra recompensa do que a glória e a honra, nem outro intuíto do que servir a Pátria pelo grande amor e respeito que se tinha dela. Assim, neste apartado, irei publicando pequenos pedaços de históriam um exemplo para todos nós, de que houve e é possível haver, um outro Portugal, com uma outra gente, que luta pela Pátria e pelos valores correctos, em vez de se servir dela para a extorquir, explorar e violar em seu próprio e único interesse. Que nos venha à memória a todos a nobre raça de povo que sempre fomos, mesmo pobres, que mantinha a dignidade humana e não se envergonhava do seu País. Que os nossos jovens entendam que houve quem não teve uma juventude tão fácil, tendo de lutar por valores e conceitos, que hoje tão banalmente atropelamos e deixamos cair.
Aqui fica revelado o primeiro relato destas memórias, que nos transportam a 1961, durante a invasão das forças da União Indiana ao território Nacional de Diu. Uma pequena lancha de fiscalização da Marinha Portuguesa, com a sua heróica tripulação de jovens Portugueses, não exitou perante os factos que se lhes depararam e teve o valor de se enfrentar aos todos poderosos Cruzadores Indianos. Não lhes esperavam chorosas gratificações monetárias ou favores políticos para a família. Enfrentavam a morte por amor à Nação, parava servir como tinham jurado e não para se servirem dela, como infelizmente hoje tanto vemos.
Texto: Português
Fonte: Liga dos Amigos do Arquivo Histórico Militar - Terra Web
OS HERÓIS DA LANCHA VEGA :
"Em 18 de Dezembro de 1961, faz hoje 53 anos, durante a invasão de Diu, destacou-se a ação da guarnição da pequena embarcação de fiscalização a lancha Vega.
A embarcação encontrava-se numa missão nas proximidades de Brancavará,
no extremo leste da ilha, acompanhada por uma embarcação mais pequena e
desarmada, a lancha Folque, quando a bordo se ouviu intenso tiroteio em
terra. Na sequência foi dada ordem para ocupar postos de combate e a
lancha dirigiu-se para o porto de Diu. O radar da embarcação tinha
detectado a presença de um grande eco que navegava oculto, com todas as
luzes apagadas e que navegava a aproximadamente 12 milhas da costa. A
lancha voltou ao mar e identificou o navio indiano como sendo um
cruzador. O navio indiano fez fogo com munição iluminante para
identificar a posição da lancha. Saindo do campo de tiro do navio, a lancha dirigiu-se novamente para uma posição entre o porto de Diu e o forte do mar. Às 06:15 a Vega sai novamente para identificar o navio indiano com mais precisão, tendo voltado pelas 06:30.
O comandante, o 2º Tenente Jorge Manuel Catalão Oliveira e Carmo,
trajou-se com farda de gala, afirmando que morreria com mais honra e
perguntou quem o queria acompanhar na defesa da pátria. Às 07:00 a
força aérea indiana ataca posições portuguesas em terra e a bordo é lida
à tripulação uma mensagem em que se determina que combata até gastar
todas as munições, devendo a embarcação ser destruída para não cair nas
mãos do inimigo. Às 07:30 O ataque da força aérea indiana dirige-se contra a fortaleza de Diu.
O comandante dá ordem para que se ocupem postos de combate, dirige-se
para a barra a toda a velocidade e ordena que a peça antiaérea de 20mm
faça fogo contra as aeronaves indianas. Estas tentam por várias
vezes atacar a lancha Vega, que beneficiando da sua pequena dimensão e
manobrabilidade consegue escapar várias vezes dos tiros do inimigo. A
embarcação foi finalmente atingida numa manobra conjunta de duas
aeronaves, tendo atingido mortalmente o marinheiro-artilheiro e ferido
com gravidade o próprio comandante. A peça de proa, uma oerlikon de
20mm, ficara impossibilitada de fazer fogo e a embarcação estava envolta
em chamas. As aeronaves indianas voltaram a atacar a lancha por uma
segunda vez tendo nessa segunda passagem ferindo os restantes
tripulantes e morto o comandante. A tripulação na água nadou durante
três horas contra a maré que os empurrava para o mar alto. Um dos
feridos, acabará por morrer antes de atingir terra firme e um dos
sobreviventes ficou na água durante 7 horas. Segundo os relatos da força aérea indiana foram atingidas três aeronaves."
Numa organização conjunta da
Marinha, Câmara Municipal de Bragança e da Liga
dos Combatentes vai ser prestada uma homenagem
ao Cabo artilheiro Aníbal Jardino nos próximos
dias 02 e 03 de novembro em Bragança, de onde o
militar era natural.
No dia 18 de dezembro de 1961
o Cabo artilheiro Aníbal Jardino, embarcado na Lancha
“Vega” comandada pelo Segundo-Tenente Oliveira e Carmo,
em missão no território da Índia Portuguesa de Diu,
faleceu em combate, heroicamente ao serviço de Portugal
aquando do ataque aquele território pela União Indiana.
Pela coragem evidenciada, entrega e espírito de
sacrifício revelados, o Cabo Jardino foi condecorado a
título póstumo com a Medalha de Cobre de Valor Militar
com Palma.
A forma como toda a guarnição
da Lancha Vega combateu, numa luta desigual, contra
várias aeronaves indianas, à vista da velha fortaleza de
Diu, constitui, ainda hoje, uma das páginas mais
brilhantes da História da Marinha Portuguesa.
Ordem da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito
2.º Tenente
Jorge Manuel C. de Oliveira e Carmo
Comandante
da Lancha «Vega»
Índia
Tombou em combate em 18 de Dezembro de 1961
Diz o
relatório elaborado pelos sobreviventes que «foi
atingido mortalmente no peito» por disparos de
um avião; antes, já uma rajada lhe havia cortado
«as pernas totalmente pelas coxas». O
segundo-tenente, de 25 anos, correu para a
morte. Começou por se fardar «de branco»,
explicando aos marinheiros «que assim morreria
com mais honra». Exortou-os a lutar até ao fim:
«Fazemos parte da defesa de Diu e da Pátria e
vamos cumprir até ao último homem e última bala
se possível». Já ferido, despediu-se da mulher e
do filho, beijando as fotografias que trazia no
bolso.
"Pouco se fala hoje em
dia nestas coisas mas é bom que para preservação
do nosso orgulho como Portugueses, elas não se
esqueçam"
Guerra Colonial
GUERRA DO ULTRAMAR: MOÇAMBIQUE - HISTÓRIAS DE CAMPANHA
Um dos episódios mais relevantes da nossa história contemporânea, a guerra do ultramar condicionou o nosso País. Ainda está bem presente, pois todos nós conhecemos, ou temos na nossa família até, alguém que tenha combatido numa das 3 frentes dessa guerra.
Aqui tem revelados alguns factos e histórias da campanha militar em Moçambique. Conheça como se organizou e desenvolveu a guerra nesse território, os avances e recuos, as tácticas e os inimigos. A operação militar Nó Górdio levada a cabo pelo General Caluza de Arriaga, fez com que a guerra estivesse practicamente ganha em Moçambique, mas uma decisão do Goberno sem consultar as Forças Armadas no terreno, viria a desiquilibrar a guerra a favor das guerrilhas Moçambicanas. Essa decisão chamou-se Cabora Bassa.
651 guerrilheiros mortos
; capturados: 1840
155 minas detectadas
165 campos
61 bases
40 toneladas de armamento capturadas
(a destruição de equipamento e bases é relativa ao primeiros 2 meses da operação)
A Operação Nó Górdio foi a maior e mais dispendiosa campanha militar portuguesa na província ultramarina de Moçambique, na África Oriental. Decorreu em 1970, durante a Guerra Colonial Portuguesa
(1961 - 1974). Os objectivos desta campanha consistiam em erradicar as
rotas de infiltração das guerrilhas independentistas ao longo da
fronteira com a Tanzânia
e destruir as suas bases permanentes em Moçambique. A Nó Górdio durou
sete meses, mobilizou no total trinta e cinco mil militares e foi
parcialmente bem-sucedida.
A operação consistia num cerco intenso com vista ao isolamento do
núcleo central do Planalto dos Macondes, onde se encontravam as grandes
bases de Gungunhana (objectivo A), Moçambique (objectivo B) e Nampula
(objectivo C). Após conseguido o isolamento, estava programado o
assalto e destruição destes objectivos. Atingindo estes objectivos,
esperava-se uma desarticulação e desmoralização da FRELIMO, embora esta
não tenha sido impedida de actuar em qualquer dos teatros de operações,
conforme se verificou posteriormente.
A Nó Górdio foi lançada sob ordens de Kaúlza de Arriaga,
entretanto promovido a comandante-chefe após oito meses de comando de
forças terrestres no teatro de operações moçambicano, e executada pelo Comando Operacional das Forças de Intervenção
(COFI). O início da Operação Nó Górdio foi marcado para 1 de Julho de
1970, com a presença do general Comandante-Chefe e do seu Estado-Maior
em Mueda, prolongando-se até 6 de Agosto, tendo participado mais de oito mil homens, onde se incluía a totalidade das forças especiais (Comandos, pára-quedistas e Fuzileiros) e dos Grupos Especiais e a quase totalidade da artilharia de campanha, unidades de reconhecimento e de engenharia.
Esta operação incluía acção psicológica, com uma secção instalada em Mueda, e equipas de acção psicossocial em Mueda e no Sagal.
Segundo os relatórios em Portugal, terão sido mortos 651
guerrilheiros e 1840 capturados contra 132 militares portugueses mortos.
Kaúlza de Arriaga reivindicou também que as suas tropas teriam
destruído 61 bases e 165 campos, e capturadas 40 toneladas de munição,
apenas nos primeiros dois meses.
Operação Nó Górdio
A situação em Cabo Delgado, em finais de 1969, era de acentuada pressão
sobre os aquartelamentos militares portugueses, com a minagem dos
itinerários e ataques às colunas tácticas e logísticas, tentando a
Frelimo expandir as suas acções para sul do rio Messalo.
Espalhava-se a ideia de que o Planalto Central era zona inacessível às
tropas portuguesas depois de, no final desse ano, unidades de
pára-quedistas e comandos não terem conseguido alcançar as grandes bases
da guerrilha - Gungunhana e Moçambique. Em Dezembro, dois terços das
acções da Frelimo estavam concentrados em Cabo Delgado, servindo o
triângulo serra do Mapé-Macomia-Chai como apoio dos guerrilheiros, no
seu avanço para sul. No primeiro trimestre de 1970, verificou-se a
intensificação da guerra, com a Frelimo a ultrapassar o rio Messalo, em
direcção ao rio Lúrio, e a confirmação de acções em Tete/Cahora Bassa. A
actividade da guerrilha aumentou mais de 40 por cento, continuando a
caber a maior percentagem ao emprego de minas. A Frelimo demonstrava um
maior interesse pelo sector de Tete, onde se instalavam os grandes
empreendimentos económicos de Cahora Bassa. O contínuo agravamento da
situação militar e a impossibilidade de aumentar o esforço de guerra,
quer em efectivos metropolitanos quer em material de combate, levaram o
general Kaúlza de Arriaga, ainda como comandante do Exército, a
intensificar a formação de unidades de recrutamento local, que
utilizaria intensamente como comandante-chefe. Nos finais de 1969, foi
criado o Batalhão de Comandos e formada a 1.ª Companhia de Comandos de
Moçambique. Logo em Janeiro de 1970, a Região Militar anunciou a
formação dos primeiros seis grupos especiais (GE) de milícias, com o
total de quinhentos e cinquenta homens.
Em Abril de 1970, foi referenciada a presença de Samora Machel em Cabo
Delgado, para apresentar os planos de uma grande ofensiva a executar em
Junho e Julho. Esta visita fez aumentar a actividade militar da Frelimo a
nível nunca igualado. De facto, enquanto no segundo trimestre de 1969 o
movimento realizou 154 acções, das quais 98 foram minas, no primeiro
trimestre de 1970 essas acções subiram para 685 (646 eram minas) e no
segundo para 759 (652 eram minas). Com este cenário por pano de fundo, o
general Kaúlza de Arriaga, já comandante-chefe, decide lançar a
Operação Nó Górdio, atribuindo a sua execução ao Comando Operacional das
Forças de Intervenção (COFI), criado em Novembro de 1969 para o emprego
conjunto de forças do Exército, Marinha e Força Aérea em missões de
grande envergadura, em situações de emergência e em operações especiais.
A preparação pode dizer-se que foi iniciada com a primeira experiência
do COFI, em Maio de 1970, na condução de uma operação ao longo da
estrada Mueda-Mocímboa da Praia, envolvendo unidades de comandos,
pára-quedistas e fuzileiros, apoiadas por artilharia e aviação, a qual
serviu de treino ao estado-maior do COFI e permitiu aliviar a pressão
sobre um itinerário fundamental para o apoio logístico à grande operação
que se preparava.
Entretanto, desde a tomada de posse do general Kaúlza de Arriaga que o
seu Quartel-General em Nampula trabalhava nos preparativos que iriam
concretizar o seu conceito de manobra em acções de contraguerrilha:
executar operações de grande envergadura sobre objectivos materializados
no terreno, com o máximo de forças.
Para tal, processou-se intensa acção de reparação e reunião de
materiais, sobretudo artilharia e auto-metralhadoras; transferiram-se
depósitos de munições, combustíveis e víveres para o Norte; prolongou-se
a pista de Mueda, de modo a nela poderem operar aviões Fiat G-91, e a
de Nangololo, para receber Nord-Atlas de transporte; deslocaram-se
efectivos do Sul para o Norte, incluindo algumas unidades em fim de
comissão; receberam-se novos materiais, especialmente alguns detectores
de minas e rádios; e preparou-se, finalmente, um plano de acção
psicológica destinado às populações e forças portuguesas. A maioria
destes meios foi reunido em Mueda, que se transformou em enorme base de
operações. O início da Operação Nó Górdio foi marcado para 1 de Julho de
1970, com a presença do general Comandante-Chefe e do seu Estado-Maior
em Mueda, prolongando-se até 6 de Agosto. Nela participaram mais de oito
mil homens, que representavam cerca de 40 por cento dos efectivos das
tropas de combate no território (vinte e dois mil), uma concentração que
esgotou as reservas disponíveis, pois empenhou a totalidade das
unidades de forças especiais (comandos, pára-quedistas e fuzileiros) e
os grupos especiais (GE), recém-criados, mais a quase totalidade da
artilharia de campanha, unidades de reconhecimento e de engenharia. O
conceito da operação assentava num cerco e batida com grandes meios,
prevendo o isolamento da área do núcleo central do Planalto dos
Macondes, onde se encontravam as grandes bases Gungunhana, Moçambique e
Nampula, através de um cerco ao longo dos itinerários
Mueda-Sagal-Muidumbe-Nangolo-Miteda-Mueda, com a extensão de 140
quilómetros e, após conseguido o isolamento da área, o assalto e
destruição dos principais objectivos do núcleo central:
objectivo A - base de artilharia Gungunhana;
objectivo B - base provincial Moçambique;
objectivo C - base Nampula.
A manobra seria apoiada no terreno com fogos de artilharia e de aviação,
em acções de flagelação e de concentração sobre os objectivos. Para
criar condições de aproximação a estes e actuar sobre eles, seriam
organizados agrupamentos de forças para procederem à abertura simultânea
de picadas em direcção aos objectivos A e B, o mesmo sucedendo
posteriormente para atingir o objectivo C, e, por fim, previa-se manter o
cerco e continuar a bater e a eliminar todas as organizações
referenciadas ou a referenciar. As acções militares deveriam ser
conjugadas com intensa campanha de acção psicológica, para provocar a
rendição e a desmoralização do inimigo. Os agrupamentos de cerco seriam
constituídos por unidades de caçadores e por unidades de reconhecimento,
realizando as primeiras emboscadas em permanência, enquanto as segundas
patrulhariam os itinerários. Os agrupamentos de assalto disporiam de
uma composição inter armas, do tipo task force, incluindo
unidades de forças especiais, forças regulares, de apoio de fogos
(artilharia e morteiros) e de engenharia. A esta cabia papel de grande
sacrifício e risco na abertura das picadas tácticas desde as estradas
Mueda-Miteda e Miteda-Nangololo até à proximidade dos objectivos, onde
seriam criadas as bases de ataque para as forças de assalto. A operação
era concebida como manobra do tipo convencional, em que se pretendia
alcançar com um ataque em força o que do antecedente não fora
conseguido, empregando a surpresa.
Execução da Operação:
Para cumprimento deste plano foram constituídos sete agrupamentos: dois
para o cerco (Norte e Sul) e quatro de intervenção, um para cada
objectivo e um para reserva.
- 1 Julho - Início. Os agrupamentos de cerco começaram a sua instalação.
Os agrupamentos de assalto A e B principiaram o movimento para os
objectivos.
- 3 Julho - O agrupamento de assalto B (pára-quedistas) iniciou a
progressão de Nangololo para o objectivo B - base Moçambique - , com o
apoio da engenharia na abertura da picada desde Capoca até Gole.
- 4 Julho - O agrupamento de assalto A (comandos) chegou à base de ataque, a dois quilómetros do objectivo - base Gungunhana.
- 5 Julho - Realizou-se a primeira tentativa de assalto à base Gungunhana, que não se encontrava na localização prevista .
- 6 Julho - Foi localizada e assaltada a base Gungunhana, que fora
abandonada recentemente. Estava localizada na encosta de uma pequena
colina, no interior de mata densa, ocupava a área de 100x500 metros,
dispunha de mais de cem palhotas, era circundada por uma vala e tinha
abrigos contra morteiros e ataques aéreos.
Foi assaltada a base Moçambique pelas forças pára-quedistas. Era
constituída por cerca de duzentas palhotas e encontrava-se abandonada
havia cerca de dois meses.
- 12 Julho - O agrupamento de assalto C (fuzileiros) iniciou o deslocamento de Mueda para o objectivo C - base Nampula.
- 15 Julho - Foi atingido o objectivo C. A base Nampula era constituída
por cerca de cinquenta palhotas e encontrava-se abandonada há dois
meses.
- 16 Julho a 6 Agosto - Realizaram-se acções de permanência.
Após os ataques aos objectivos A, B e C, foram organizadas bases
temporárias nas suas proximidades e atribuídas áreas de responsabilidade
aos agrupamentos de ataque, com a finalidade de eliminar da zona as
unidades de guerrilha ainda activas.
As forças de cerco mantiveram-se em posição até 2 de Agosto, realizando
emboscadas e implantando armadilhas, para completar e melhorar a
manobra.
Em coordenação com as acções militares foram realizadas operações
psicológicas com a finalidade de separar as populações dos
guerrilheiros, desmoralizar os combatentes e fomentar as apresentações,
considerando-se que a Frelimo controlava cerca de sessenta mil pessoas
na zona do planalto.
Para este efeito, foi instalada em Mueda uma secção de acção
psicológica, constituídas equipas de recepção de refugiados em Sagal,
Diaca, Miteda e Muidumbe e equipas de acção psicossocial em Mueda e no
Sagal. Também as autoridades administrativas receberam instruções para
armazenar reservas de víveres, a fim de fazerem face às necessidades
imediatas de apresentados e capturados.
Contudo, «não obstante a acção psicológica realizada pelas forças
nacionais, as populações não se apresentaram. De forma geral,
afastaram-se para fora do alcance das forças militares e construíram
novas palhotas, ou então regressaram para a proximidade das antigas,
logo que lhes foi possível» (extracto do relatório de operação).
Apreciação final da situação pelo comando português:
«Em relação ao inimigo, ele foi:
- Desarticulado, em consequência da destruição das suas organizações;
- Atemorizado, pelo potencial e espírito ofensivo das NT, em que não acreditava;
- Desmoralizado, pelas carências de toda a ordem;
- Desprestigiado perante as populações.
As populações, cansadas de luta tão prolongada, apresentavam acentuado
desequilíbrio psicológico. Chegou a "sentir-se" claramente que a
população vacilava entre continuar a resistência ou entregar-se.
As forças nacionais, em resultado da consumação, com êxito, de uma
operação duríssima e da sua superioridade sobre o inimigo, mostravam-se
confiantes em si próprias e nos seus chefes e compreendiam a necessidade
de continuar a luta até à vitória final.
Com a destruição do "mito" do núcleo central, toda a iniciativa no
distrito de Cabo Delgado passou, sem qualquer dúvida, para as forças
nacionais» (extracto do relatório da operação).
A Frelimo, apesar da Operação Nó Górdio, não foi impedida de actuar em
qualquer dos teatros de operações. A sua actividade no terceiro
trimestre de 1970 provocou as seguintes baixas e destruições às forças
portuguesas, nas zonas não abrangidas pela operação:
De facto, só em Cabo Delgado, onde se desenrolou a Operação Nó Górdio,
as forças da Frelimo realizaram, durante o período em que ela durou
(Julho) e depois de anunciada a vitória portuguesa (Agosto e Setembro),
as seguintes acções fora da zona de operações:
- 12 de Julho - Ataque a Miteda com um grupo de cerca de cem
guerrilheiros, que só se retiraram após as forças portuguesas terem
utilizado helicópteros armados e canhão sem recuo;
- 15 Julho - Colocação de 73 minas na estrada Montepuez-Nancatari-Mueda;
- 15 e 16 Julho - Colocação de engenhos explosivos perto de Omar (a norte do núcleo central);
- 21 de Julho - Emboscada na estrada Muaguide-Meluco, a sul do rio Messalo, na região de Macomia;
- 28 e 29 de Julho e 17, 27 e 29 de Agosto - Ataques ao aquartelamento
de Omar, sempre com forte potencial de fogo (canhões sem recuo e
metralhadoras pesadas) e muito próximo do aquartelamento.
Estas acções da Frelimo, fora da área em que se desenrolou a Operação Nó
Górdio, demonstram que o movimento manteve operacionais as suas
estruturas em todos os sectores. No Niassa, durante este período,
realizou 142 acções, mais 23 do que no trimestre anterior e mais 34 do
que em igual período do ano de 1969. Em Tete, efectuou neste trimestre
239 acções, mais 100 do que nos três meses anteriores e mais 141 do que
em igual período do ano de 1969.
Em resumo, na zona de Cabo Delgado a Operação Nó Górdio não fez diminuir
as acções militares da Frelimo nas áreas exteriores ao núcleo central,
onde as forças portuguesas concentraram o seu esforço. Nas frentes do
Niassa e de Tete, o movimento aumentou significativamente o número das
suas acções.
Em 3 de Agosto, ainda antes do final oficial da Operação Nó Górdio, em
ofício enviado pelo Comando-Chefe de Moçambique ao Secretariado-Geral da
Defesa Nacional (SGDN), Kaúlza de Arriaga transmitia a opinião de que
«vencida e ultrapassada esta fase da guerra em Moçambique, outra poderá
ter lugar na qual o inimigo disporá de meios mais evoluídos, como carros
de combate, foguetões terra-terra e aviões de combate».
Em Dezembro de 1970, também em ofício para o SGDN, o comandante-chefe de
Moçambique afirmava: «Não é possível garantir o sucesso em Moçambique
com efectivos actuando em terra inferiores a 105 companhias de
caçadores, nove companhias de comandos e quatro companhias de
pára-quedistas.»
Em Outubro de 1970, dois meses após o final da operação, o Comando-Chefe
de Moçambique considerava como possibilidade mais perigosa que a
Frelimo afectasse gravemente o distrito de Tete pelo incremento das
acções de guerrilha e pelo seu alastramento à Angónia e a Tete, o que,
de facto, veio a verificar-se.
Na sequência da Operação Nó Górdio, as forças portuguesas planearam a
Operação Fronteira,canalizando o seu esforço para Norte, enquanto a
Frelimo reorientava a sua prioridade para Tete e para o Sul, mantendo
contudo pressão suficiente no Norte, para não permitir que as forças
portuguesas deslocassem efectivos.
Em contraguerrilha, as operações de grande envergadura ficam, de modo
geral, aquém dos resultados esperados, mas a verdade é que surgem sempre
comandantes tentados a lançá-Ias.
A Frelimo seguiu as máximas de Sun Tsu, de retirar quando o inimigo
ataca e de o atacar quando ele se movimenta. Não admira, por isso, que
se verificasse reacção violenta dos guerrilheiros à movimentação das
forças portuguesas, em especial na abertura das picadas tácticas, quando
estas se encontravam mais vulneráveis; que não defendessem as suas
bases, porque o terreno não é importante na guerra de guerrilha; e que o
cerco das forças portuguesas não produzisse os resultados desejáveis,
pois era muito extenso, os guerrilheiros e as populações conheciam o
terreno e a localização das emboscadas, os efectivos disponíveis eram
escassos em relação às missões e constituídos ou por unidades
recém-chegadas ou que já tinham terminado as suas comissões.
Mesmo o objectivo de conquistar as populações ficou longe de ser
alcançado, pois a área era demasiado extensa para as possibilidades de
exploração das forças de assalto aos objectivos, o que deu às populações
a possibilidade de aguardar o resultado dos acontecimentos em relativa
segurança, fora do alcance das forças de cerco. Não admira, por isso,
que não se tivesse verificado o êxodo das populações com as consequentes
capturas. Acresce que as intensas campanhas de acção psicológica,
utilizando meios aéreos de difusão de mensagens, também não motivaram
apresentações.
Guerra Colonial
GUERRA DO ULTRAMAR: OPERAÇÃO MAROSCA - O MASSACRE DE WIRYAMU
Muitas vezes somos confrontados com filmes da guerra do Vietname e da heroicidade dos soldados Americanos. Esquecemo-nos que Portugal teve a sua guerra e não numa só frente, mas em várias frentes. Uma guerra que talvez tenha sido tão dura, ou ainda mais, do que a do Vietname.Como não temos a poderosa industria cinematografica que tem os USA, pouco sabemos dos episódios dessa guerra sangrenta. Por isso, esta é uma oportunidade única de tomarmos contacto com um dos episódios negros da nossa guerra do ultramar e do inferno que ela constituiu para as povoações e para os nossos soldados. Conhecida como "Operação Marosca", nunca foi oficialmente reconhecida, no entanto é inegável que algo se passou naquele dia fatídico.
O episódio deu-se em Moçambique na região do Tete, a 16 de Dezembro de 1972, vindo a ser denunciado pelo padre católico Irlandês Adrian Hastings a uns missionários Espanhois. Os relatos afirmam que as tropas Portuguesas (victimas de inúmeras emboscadas por denuncias dos habitantes dessas aldeias que lhes causavam a morte, há que dizê-lo) bombardearam com aviões e desembarcaram de 5 helicópteros nessas aldeias, tendo cercado as aldeias e matado cerca de 400 pessoas.
Estes relatórios foram usados contra o governo Português, por Nações estrangeiras com interesses em África e por partidos políticos Portugueses, então proíbidos e na clandestinidade, como forma de pressão para acabarem com a guerra e darem a independência aos territórios então em guerra, pelo que se pensava terem sido exagerados. No entanto, é sabido que em todas as guerras há excessos.
25 anos passados, o então comandante da companhia de Comandos que executou as ordens, arrisca a vida e volta ao local onde tudo aconteceu, para saber o que realmente aconteceu e se o que os relatórios contam são verdade.
Aqui tem revelada toda a informação acerca deste terrível episódio, com relatório das victimas, relatos de sobreviventes, descrições e imagens dos acontecimentos com pormenores que podem afectar a sua sensibilidade.
Trata-se sem dúvida de um documento que mostra a crueldade de todas as guerras em geral, e em particular da pressão a que estiveram expostos os nossos soldados.
Lembro que de forma alguma podemos, a esta distancia e fora desse ambiente, julgar o comportamento de quem quer que seja (nem é isso que se pretende com esta publicação) até porque em primeiro lugar, esses soldados cumpriram ordens. Apenas pretendo lembrar uma época pela qual muitos dos nossos familiares passaram e alguns estiveram expostos. Portugal não tem de receber lições de nenhum País, acerca de ser Patriotas, lutar pela Pátria, grandes soldados, heróis de guerra, guerras brutais ou sobre ações de solidariedade e defesa das populações que ficam muito bem nas telas dos cinemas de alguns Países. Também nós tivemos as nossas guerras e os nossos heróis. Feliz ou infelizmente.
* LISTA DE VICTIMAS E RELATÓRIOS SOBRE O MASSACRE:
OS MASSACRES DE TETE
16 de Dezembro de1972
O
texto que se segue sobre os massacres de Chawola, Wiriyamu e Juwau,
confirmam as afirmações feitas pelo padre Hastings, com base no
testemunho dos 3 padres de Burgos expulsos depois dos massacres e é
ainda confirmado por varias pessoas (soldados e civis) que estiveram em
Tete nesta altura.
I. O MASSACRE DE CHAWOLA ( Sab. 16/12/72 )
Mais ou menos pelas pelas 14 horas, 2 reactores bombardearam as
povoações de Wiriyamu e Juwau a uns 25 Km de Tete (cidade), no regulado
de Gandali; enquanto 5 helicópteros desembarcavam tropas armadas , que
cercavam as ditas povoações e metralhavam o povo , que fugia do
bombardeamento.
Eram duas grandes povoações, mas não sabemos o número dos sobreviventes.
O certo é que tais povoações foram totalmente aniquiladas e arrasadas. A
população de Chawola, povoação esta muito próxima das de Wiriyamu e
Juwau. vendo o fogo dos bombardeamentos, das metreIhadoras e das
palhotas a arder, juntou-se aterrorizada no pátio de Chawola. Pouco
depois viu-se cercada pelas tropas, que entravam a disparar. O povo
tentou fugir, mas os soldados reuniram de novo e imediatamente saquearam
as palhotas (roubando dinheiro, roupa, rádios, etc.).
A seguir as tropas obrigam o povo a bater as palmas, para se despedir da
vida, visto que já ia morrer, ordem a que o povo obedeceu. Enquanto
batia as palmas, os soldados abriram fogo sobre a população reunida,
fuzilando homens, mulheres e crianças. Juntaram os corpos, cobriram-nos
de capim e deitaram-lhes fogo.
Enquanto os soldados incendiavam as palhotas, alguns, que tinham sido
apenas feridos, e conseguiram sair da pilha já a arder. Destes, uns
morreram no mato e outros encontram-se hospitalizados.
No dia seguinte ao destes massacres, somente no pátio de Chawola,
contaram-se 53 cadáveres, dos quais foram identificadas os seguintes:
1. Chawola 2. Mwataika (mulher de Chawola)
3. Xavier (jovem, irmão de Chawola)
4. Mixoni
5. Firina (mulher de Mixoni)
6. Luciano (filho de Mixoni,adulto)
7. Rita (filha de Mixoni,7a.)
8. Irisoni
9. Soza (mulher de Irisoni}
10. Liria. (mulher de Irisoni)
11. Posi (filha de Irisoni, 1 mês)
12. Chinai (filho de Irisoni,8a)
13. Tsapwe (filho de Irisoni, 9a)
14. Lusia (filha de Irisoni, 9a.)
15. Chipiri (filho de Irisoni, 8a)
16. Ramadi (filho de Irisoni)
17. Luisa (muler de Ramadi)
18. Manuel (filho de Ramadi,1 ano)
19. Akimo
20. Joana (mulher de Akimo)
21. Birifi 22. M'balamyama (mulher de Birifi)
23. Kapeno (filho de Birifi, 7anos)
24. Mataka (filho de Birifi, 9a)
25. Batista .
26. Asseria (mulher de Batista}
27. Makau (filha de batista, 8a)
28. Sabudu (filho de Batista,3 anos)
29. Medeka 30. Firipa (mulher de Medeka)
31. Adamu (filho de Medeka 10 anos)
32. Mechenga 33. Chifanikiso (filho de Mechenga)
34. Kunesa 35. Julio (filho de Kunesa, 15)
36. Mako
37. Pinto (11anos)
38. Mayesa (9 anos)
18. Manuel (filho de Ramadi, 1ano)
39. Kundani 19. Akimo
40. Djipi (9anos)
20. Joana (mulher de Akimo)
41. Nsembera
21. Birifi 42. Pita
1º - Todos estes factos foram-nos narrados pelos tais
sobreviventes, que conseguiram sair da pilha e se encontram
hospitaliados em Tete e tambem por outros que lograram escapar a tempo.
2º -A identificação dos cadaveres fo levada a efeito por pessoas que, de proposito se deslocaram as povoações massacradas
3º - Os que conseguiram sair da pilha foram:
1. Antonio (filho de Mixoni, 15 anos)
2. Domingos (filho de Mixoni, 4 anos)
3. Serina (filha de Irisoni, 13 anos)
4. Tembo (filho de Batista, 5 anos)
5. Manuel (filho de Mwantulujali, 15 anos)
6. Podista (mulher de Mchenga)
Se fizermos um inquerito apoiado pelas autoridades, poderiamos saber se o
numero de mortos de todas as aldeias massacradas naquela area
ultrapassa os quinhentos como o povo assegura.
Se não houve massacre, se so foi destruida uma base de terroristas, se
crianças de 1 a 10 anos não são "terroristas" ; se velhos e velhas e
mulheres com crianças ao colo não são "terroristas", não teremos então
receio de abrir um inquerito público, para verificar a veracidade destes
massacres.
Se apenas foi destruido um acampamento de "turras", e se um acampamento
de "turras" não é o mesmo que uma povoação tradicional onde vivem
homens, mulheres e filhos, onde tem a sua mapira, 0 seu milho, 0 seu
vestuario, etc. que vamos então ao local destas povoações, que existiam
com os seus habitantes e haveres, e encontraremos a realidade!- que não
foi um acampamento de "terroristas" que foi destruido, mas um grupo de
povoações com as suas populações indefesas.
Tete, 19 de Dezembro de 1972
P.S. -Na altura em que acabavamos de redigir este relatorio, chegou-nos a
noticia de que os massacres ainda continuavam em várias outras
povoações como na de Luis, Corneta e outras, avançando para Gama, no
régulado do Rego.
II - O MASSACRE DE WIRIYAMU E JUWAU (sábado 16-12-72 )
Estivemos em busca de elementos de juizo.
Apesar das dificuldades que surgiram (impostas umas, circunstanciais
outras), de elaborarmos uma lista completa dos nomes das vitimas do
massacre das povoaçoes de Wiriyamu e Juwau , as fontes dos pormenores
que conseguimos dão-nos 0 direito de seguirmos mantendo a afirmação de
ali ter havido mais quatro centenas de vitimas (cerca de 500).
Da nossa diligencia pudemos apurar 0 seguinte:
Na tarde do dia 16 de Dezembro do ano findo, como já ficou dito na
primeira parte deste nosso relatório, as povoações de Wiriyamu e Juwau
foram vitimas de uma incursao militar, da parte das forças da orderm.
Depois do bombardeamento, os soldados-comandos, previamente
heli-transportados que jaá haviam posto cerco às ditas povoações
invadiram-nas com fúria, aumentando a terror dos seus habitantes já em
panico pelos bombardeios.
Uma vez dentro das povoações, esse grupo entregou-se imedatamente ao
saque das palhotas, seguindo-se depois o massacre do povo, que se
revestiu de excesso de crueldade.
Um grupo de soldados juntou uma parte do povo num pátio, para 0
fuzilamento. O povo assim reunido foi obrigado a agrupar-se sentado em
dois grupos: 0 grupo dos homens, num lado, e o das mulheres, noutro, a
fim de poderem todos ver melhor como iam caindo os fuzilados.
Um soldado chamava por sinal a quem quisesse (quer homem, quer mulher, quer criança),
0 designado punha-se de pé, destacava-se do conjunto, 0 soldado
disparava sobre ele e a vitima caia fulminada. Este foi 0 processo que
fez mais vitimas. Muitas crianças morreram ao colo das suas maes,
fuzilada juntamente com elas. Entre muitos outros. os soldados assim
mataram:
1 Dzedzereke (homem adulto)
2 Mafita (mulher de Dzedzereka)
3 Kufuniwa (filho de " )
4. Birista (mulher adulta)
5. Luwo (rapaz ,2 anos)
6. Lekerani (homem adulto)
7. Sinoria (mulher de Lekerani)
8. Chamdindi (filho de Lekerani, 5 an.)
9. Nguiniya (mulher adulta)
lO.Firipi (homem adulto)
11.Bziyese (mulher de Firipi)
l2.Feta (filha de Firipi)
l3.Meza (filho de Firipi)
80.Chuva (homem adulto)
81.Kirina (mulher de Chuva)
82.Fuguete (homem adulto)
83.Rita (rapariga, 4anos)
84.Eduardo (rapaz, 7anos)
85.Tembo (rapaz, 3anos)
... Outros soldados,que andavam dispersos, obrigavam a gente a meter-se
para dentro das palhotas, que depois incendiavam, morrendo a gente
queimada dentro delas.
As vezes, antes de pegar fogo as palhotas, lançavam para dentro delas
granadas, que explodiam sobre as vitimas. Depois é que deitavam fogo as
palhotas. Dessa maneira, entre outros,
foram mortos:
I.Chakupendeka (homem velho)
2.Bwanbuluka (mulher de Chak.)
3.Kulinga (filho de Chak.)
4.Naderia (mulher de Kulinga)
5.Luwa (filha de Ruling, 2an.)
6.Marianela (filh. Kulinga,4 an.)
7.Tembo (filho de Kulinga, 8meses)
32. Maria (rapariga, 2 anos)
33. Boy (rapaz,3 anos)
…Outros soldados divertiam-se a matar crianças, agarrando-as pelas
pernas, arremessando-as contra o solo ou contra as árrvores. Entre
várias crianças, assim morreram:
Uma voz autoritaria fazia-se ouvir cam frequencia: "Pham. ,wense!"
"Matai-os a todos". "Que não fique nenhum!". Era a voz do agente da
D.G.S., Chico Kachavi.
Diz uma testemunha que um oficial militar tinha sugerido a via da
clemencia, no sentido de conduzir aquela pobre gente para um aldeamento.
Mas a voz sinistra do agente Chico fez-se ouvir ainda com mais furia:
"Sao ordens do nosso chefe" -dizia –“ Matar a todos. Os que se poupam
são os que nos têm denunciado".
Duas crian~as daquelas povoa~oes, encontradas casua1mente depois da
consumação do massacre, foram friamente queimadas dentro de uma choça
pelo mesmo agente da D.G.S. sob 0 pretexto de uma possível denuncia.
Naquela tarde. em Wiriyamu e Juwau só se ouviam os berros dos soldados,
os disparos das armas e os gemidos das vitimas feridas de morte. –O povo
de Wiriyamu e Juwau viveu momentos de terrível angustia!
Estas cenas duraram ate ao por-do-sol. Nessa altura a soladesca estava
ja fatigada de tanta sevícia. Algumas vitimas lograram escapar da morte,
fugindo. Elas deram-nos também, como testemunhas oculares muitos dos
promenores aqui expostos que, por ' isso, asseguramos ser autênticos.
Demais a Comissao da Delegação de Saúde de Tete, que se deslocou ao
local de massacre cerea de vinte dias depois (muito tarde, por
conseguinte!), para averiguação, não desmente nosso re1atorio.
Tete, 6 de Janeiro de 1973
(excertos retirados de de um relatório policopiado que circulava clandestinamento em Moçambique em 1973)
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Mystery Massacre Time, Monday, Jul. 30, 1973
Not since the My Lai atrocities came to light in 1969 had a tiny village
caused such an uproar. Father Adrian Hastings, a British Catholic
priest, alleged that Portuguese government troops had gone on a
murderous rampage in the Portuguese Mozambique village of Wiriyamu last
Dec. 16. The priest, quoting reports from Spanish missionary priests,
claimed that Portuguese soldiers killed some 400 villagers suspected of
sympathizing with Frelimo, the Mozambique Liberation Front.
Then began the denials. Dr. Marcello Caetano, the Portuguese Prime
Minister, who was on an official visit to London, said that his
government's preliminary inquiry showed a massacre of 400 villagers
"could not have taken place." A Catholic bishop in Mozambique who in
published reports claimed that he had seen the dead bodies later
stubbornly declined either to confirm or deny that there had been a
massacre. In Lisbon, officials insisted that Wiriyamu did not even
exist. Indeed, Father Hastings two weeks ago placed it in western
central Mozambique, but next day corrected himself, saying it was in the
eastern Tete province. Reporters have been searching for it ever since,
and for anyone who claims to have seen the massacre. TIME Correspondent
Peter Hawthorne joined a trek last week and afterward sent this report:
The town of Tete bristles with troops, military roadblocks and armored
vehicles. People are being moved out of isolated villages and relocated
in protected settlements called aldeamentos, where troops and home-guard
units keep Frelimo infiltrators at bay.
A 30-man army escort took us to a place called Wiliamo, about eight
miles from Tete. The guide was a black army private who said he knew of
the village.
He pronounced it "Wiriamu"—many Africans pronounce "l" as "r"—but wrote
it "Wiliamo." It was the only place of that name that he knew in the
region, he said. Of course there are villages with vaguely similar names
all over the areas variously mentioned by Father Hastings, and
presumably any of them could be the massacre site.
The village, perhaps ten to fifteen huts, had clearly been abandoned in a
hurry. But there was no obvious sign of a firefight—no bullet marks in
the tree stumps or huts. It would require nothing less than a team of
forensic experts to track down any evidence of a massacre.
No Angels. "My men aren't angels or they wouldn't be good soldiers,"
said Major José Carvalho, who led the army escort. "But a massacre of
400? During my two years service here I've never heard of such an
incident, and if I did it would be the reason for a large-scale military
inquiry."
Two priests of the Spanish Burgos Fathers who earlier supported
allegations of the massacre have been detained by Portuguese authorities
in Lourengo Marques on unspecified charges "relating to the security of
the state." Their fellow priests at the Mission of São Pedro, near
Tete, will say nothing. Some Portuguese here believe it is quite
possible that a massacre did occur. The secretary of the Bishop of Tete,
Father Manuel Mouro, told me:
"In a climate of war anything is possible —but between the possible and the real, there may be a big difference."
"Portugal
planeou um genocídio?",
publicado no jornal Público, de 10 de Setembro
de 1995
* TESTEMUNHO E DATAS COM ANTECEDENTES AO MASSACRE:
Um massacre ainda
"desconhecido"
Wiriyamu,
Moçambique, 12 dez (Lusa) - Passaram 40 anos sobre o massacre de Wiriyamu,
cometido por tropas especiais portuguesas sobre civis suspeitos de apoiarem a
Frelimo, no centro de Moçambique, mas os contornos da "Operação
Marosca" continuam ainda envoltos num certo mistério.
"Continua
difícil verificar com precisão os acontecimentos de 16 de dezembro de 1972
(...) Isto porque as autoridades portuguesas, quer antes, quer depois do golpe
de 25 de abril de 1974, não autorizaram um inquérito independente à Operação
Marosca", queixam-se os investigadores portugueses Bruno C. Reis e Pedro
A. Oliveira num texto publicado em março deste ano na revista 'Civil Wars'
("Cutting Heads or Winning Hearts: Late Colonial Portuguese
Counterinsurgency and the Wiriyamu Massacre of 1972").
Apenas um pequeno
sinal, quase escondido na berma da estrada nacional 7, à saída de Tete, indica
o desvio para Wiriyamu, o local de um dos maiores massacres ocorridos na então
província portuguesa e que terá apressado o fim das guerras coloniais que
Portugal travava em África.
Na aldeia, um
monumento com ossadas humanas evoca a tragédia ocorrida em Wiriyamu, Juwau e
Chawola, três povoados nas cercanias dos rios Zambeze e Luena, mas o jovem
Carrilho, 12 anos, que ali passa de bicicleta, não consegue identificar nem os seus
responsáveis nem o que aconteceu.
O diretor da escola
primária completa de Wiriyamu, Carlos Alciano, 40 anos, garante que o massacre
faz parte do programa de ensino dos alunos da sexta e sétima classes e que as
visitas ao monumento são frequentes.
"Eles têm que
conhecer quando surgiu o massacre, quem o fez, quantas pessoas morreram",
diz, mas o número de vítimas varia: "400", segundo os padres de
Burgos, os primeiros a denunciaram o massacre, "cerca de 200", de
acordo com o médico Rodrigues dos Santos, que visitou o local pouco depois dos
acontecimentos, "63" ou "98", assumidas por autoridades
portuguesas, segundo diversas fontes, ou os "450" evocados na base do
monumento em Wiriyamu.
Independentemente
do número de mortes, a "Operação Marosca" resultou num massacre,
"a ocorrência de crimes e, por vezes, extremamente cruéis, execuções de
civis desarmados, em grande número", asseguram os dois investigadores
portugueses.
Bruno Reis e Pedro
Oliveira defendem, no entanto, que, se se pode dizer que se tratou de
"matança indiscriminada", já que ninguém foi poupado, também se pode
afirmar o seu contrário, no sentido de que "a operação tinha como alvo o
que era visto como bases da Frelimo disfarçadas de aldeias civis" e que os
militares portugueses se baseavam em informações aparentemente falsas da
PIDE/DGS.
"Isto, de
nenhuma forma, reduz a criminalidade destas mortes mas, simplesmente, alarga a
responsabilidade para lá dos soldados individuais e seus comandantes",
escrevem.
À operação estão
associados o então comandante militar de Moçambique, Kaúlza de Arriaga, e o seu
conceito de luta anti-guerrilha, envolvendo fortes meios aéreos e tropas
especiais, e o agente da PIDE/DGS Chico Kachavi, um moçambicano temido pelos
seus conterrâneos.
"Ele é que
comandava nesse dia, e não queria saber se este era africano. O coração dele
era europeu", recorda Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, sobrevivente do
massacre, e que diz que o agente da PIDE/DGS foi mais tarde morto por elementos
da Frelimo.
LAS // HB
Principais datas
relacionadas com massacre
12 de Dezembro de
2012, 08:44
Maputo, 12 dez
(Lusa) -- Há 40 anos, tropas especiais portuguesas entraram em três aldeias no
centro de Moçambique e mataram centenas de pessoas no que foi conhecido como o
massacre de Wiriyamu.
A violência
indignou o mundo, isolou Portugal e contribuiu para o agravar das divergências
nas Forças Armadas portuguesas, que conduziriam ao 25 de Abril de 1974, e
também para o reforço da Frelimo que, menos de dois anos depois, proclamou a
independência de Moçambique.
Cronologia das
principais datas:
1962
25 set - Frelimo
inicia luta armada contra colonialismo português, no norte de Moçambique.
1968
08 mar -- Frelimo
abre frente de Tete, no centro.
1970
01 jul/06 ago --
"Operação Nó Górdio", dirigida por Kaúlza de Arriaga, no norte de
Moçambique, contra a Frelimo
1972
18 nov -- Grande
ofensiva da Frelimo em
Cabo Delgado, Niassa e Tete
14 dez -- Um avião
civil que sobrevoa Wiriyamu é alvejado. No mesmo dia, a PIDE/DGS envia uma
equipa ao terreno para obter informações sobre o caso.
15 dez - Seis
militares portugueses são mortos numa emboscada, enquanto batiam a zona.
16 dez - Assassínio
de cerca de 400 pessoas nas povoações de Chawola, Juwau e Wiriyamu, a cerca de
25 quilómetros da cidade de Tete
1973
06 jan --
Representante da Cruz Vermelha e médico do hospital de Tete visitam o local do
massacre.
Jun - Denúncia dos
missionários espanhóis, a quem tinham sido passadas as primeiras informações,
enviada à Amnistia Internacional em Londres
07 jul -- Notícia
do massacre na capa do 'The Times', de Londres
15 jul -
Manifestação em Londres contra a política africana do Governo português, pedindo
a anulação da visita do presidente do Conselho português, Marcelo Caetano.
16 jul -- Marcelo
Caetano inicia visita a Londres, por ocasião dos 600 anos da aliança
anglo-portuguesa, no meio de fortes protestos.
01 ago - Kaúlza de
Arriaga abandona o cargo de Comandante-Chefe das Forças Armadas de Moçambique.
21 ago --
Comunicado do Ministério da Defesa de Portugal que admite que "alguns
elementos das Forças Armadas, em destacamento, ignorando ordens, cometeram atos
repreensíveis na região de Tete".
1974
07 set -- Portugal
e Frelimo concordam na independência de Moçambique, marcada para 25 de junho de
1975.
22 nov -- Relatório
da comissão de inquérito da ONU aos noticiados massacres em Moçambique: "A
comissão dá-se por completamente satisfeita com as provas de que, a 16 de
dezembro de 1972, tropas portuguesas dirigidas por agentes da DGS cercaram as
aldeias de Chawola, João e Wiriyamu, entraram nas aldeias, mataram qualquer
pessoa à vista e, na operação, destruíram as aldeias (...). Estima-se que o
número de vítimas seja superior a 400 nas três aldeias".
LAS // HB
O massacre de
Wiriyamu segundo o sobrevivente Vinte Pacanet Gandar - reportagem
12 de Dezembro de
2012, 08:44
Luís Andrade de Sá,
da Agência Lusa
Wiriyamu,
Moçambique, 12 dez (Lusa) - Não é por terem passado 40 anos que parece que as
coisas mudaram em Wiriyamu: não há eletricidade nem água e a cidade de Tete, a
30 quilómetros, ligada por uma picada de terra batida, continua
insuportavelmente distante.
"E fome
existe, também", acrescenta Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, camponês de
Wiriyamu. E, para que não restem dúvidas, repete: "E fome".
A quase permanente
seca na região, no centro de Moçambique, afeta a produção de mapira e amendoim,
que todos cultivam para consumo próprio, e o pouco dinheiro, as raras moedas
que usam para comprarem óleo ou sementes, obtêm-se com a venda de carvão na
cidade.
Luís Wiriyamu, 27
anos, neto do homem que deu o nome à aldeia, vive de apanhar lenha que, depois,
transforma em carvão e vende na berma na estrada -- "Não há mais nada para
fazer aqui", queixa-se.
A escola primária,
um painel solar numa pequena venda e os camiões de uma mineira australiana, a
caminho de mais um projeto nas imediações, destacam-se na paisagem de casas de
paredes de barro e telhados de colmo, em veredas de terra batida, por entre
embondeiros e mato cerrado, por onde meninas carregam à cabeça feixes de lenha
que vão alimentar o fogo com que mulheres cozinham o almoço.
Vinte Pacanet
Gandar, que se expressa num português desenvolto, foi um dos sobreviventes do
massacre de Wiriyamu perpetrado naquela aldeia por tropas portuguesas, no dia
16 de dezembro de 1972, que vitimou centenas de pessoas e, segundo
historiadores, mudou o rumo da guerra colonial.
A sua condição de
sobrevivente granjeou-lhe fama, mas também a construção de uma narrativa, quase
de um fôlego, do massacre cometido por tropas especiais portuguesas.
"Surpresamente,
apareceram cinco helicópteros e dois jatos que começaram a bombardear lá fora,
e, então, aterraram na aldeia para os soldados saírem", conta Vinte, que
tinha, então, 23 anos.
A "Operação
Marosca" tivera como motivos próximos a morte, dois dias antes, de seis
militares em Tete, e disparos, na zona, contra um avião civil, sinais para as
chefias militares de que a Frelimo atuava no centro da colónia, com o apoio da
população.
"Cercaram a
nossa aldeia. Começaram a queimar o quê? As casas. Levaram as pessoas para
acumular lá fora. E começaram a perguntar: 'Vocês aí, não conhecem os turras? E
nós falávamos: 'Não, não conhecemos'", prossegue o camponês.
As sucessivas
lideranças militares portuguesas em Moçambique tinham encarado de forma
diferente o "problema" da Frelimo e a guerra de libertação iniciada
em 1962, e, no início, apenas circunscrita ao norte do país.
Comandante militar
desde 1969, Kaúlza de Arriaga inova relativamente aos seus antecessores, ao
usar intensivamente meios aéreos e tropas especiais, o que fragiliza a Frelimo
no norte, obrigando-a a deslocar-se para o centro, onde intensifica essa frente
de guerra e se ataca, até, colonos portugueses.
"Mas eles
disseram: 'Não, não, aqui há turras e vocês estão a tirar comida para dar aos
turras para os turras vir matar a nós, lá na estrada. Por isso, vocês, hoje,
não vão viver nada, vão ser mortos aqui'", continua Vinte, dando a voz aos
militares portugueses.
A zona de Wiriyamu
estava a ser batida desde o dia 14 por aviões militares e agentes da PIDE/DGS,
que procuravam uma base da Frelimo com cerca de 300 guerrilheiros.
Depois, tropas
especiais entram em Wiriyamu, Juwau e Chawola, todas aldeias na mesma zona, e,
a 16 de dezembro, recolhem aos quartéis, deixando um rasto de destruição, hoje
evocada num monumento que guarda caveiras e ossadas de alguns dos "mais de
450 mortos".
Vinte safou-se,
correndo para o mato e evitando os tiros que disparavam contra ele, mas a sua
família foi quase toda dizimada: "Quem morreu? O meu pai, chamado Guspiga,
meu avô, Jemusse, Mabalata, Manyate ... são muitos ... Tuma, Capitone... são
muitos".
Alguns feridos
abrigam-se no hospital de Tete e denunciam o massacre a missionários espanhóis.
No início de 1973, a Cruz Vermelha e um médico português visitam o local, em
junho do mesmo ano, o escândalo chega à imprensa internacional, e Portugal,
que, até aí, tinha negado os acontecimentos, acabará por admitir
"excessos" das suas tropas.
Dois anos depois de
a notícia ser capa do 'Times', de Londres, Moçambique torna-se independente e,
40 após o massacre, só por distração alguém pode achar que continua tudo igual
em Wiriyamu.
"Antigamente,
não tínhamos escola. As pessoas que têm idade como a minha não falam português,
aqui, mas, hoje, as nossas crianças estão a estudar e, quando acabarem, vão
fazer bom trabalho", prevê Vinte Pacanet Gandar, o camponês de Wiriyamu
que sobreviveu ao massacre.